Select Page
A B C D É F G H Í J K L M N O P Q R S T Ü V W Z

Quase todas as concepções de leitor descritas pelos teóricos que mais se preocuparam com a recepção das obras literárias determinam que, para ler convenientemente, o indivíduo se deve despir de todas as ideias pré-concebidas, tendências pessoais e idiossincrasias, e vestir-se tanto de competência linguística e de competência semântica como de competência literária (é Fish quem enumera, concretamente, estas três competências). Normand Holland é dos poucos críticos a admitir que “o processo [da leitura] é tão intuitivo e imaginativo como racional” (“Unity Identity Text Self”, 1975) e que cada leitor irá agrupar elementos do texto em temas, ou num tema central, que serão obviamente importantes para si, embora não necessariamente para outros leitores. Na prática, logicamente, os leitores imparciais de Poulet, Fish, Riffaterre e Culler não existem: pelo contrário, só encontramos realizações imperfeitas daquilo que cada persectiva teórica definiu como leitor ideal (v), já que nenhum indivíduo se pode abstrair por completo dos seus preconceitos, da sua ideologia, da sua personalidade e tendências particulares para ler um texto de acordo, exclusivamente, com determinados pressupostos teóricos. Para além disso, e de acordo com Hans Robert Jauss (um dos mentores da estética da recepção) o leitor real deve ainda ser considerado sob uma perspectiva diacrónica, já que efectua uma leitura necessariamente marcada pelo momento histórico em que se insere, pelo que, de resto, a crítica se deveria preocupar antes de mais com o estudo da relação entre a recepção que a obra teve no passado e a que tem no presente.

Ao mesmo tempo, contudo, também se pode entender que o termo “leitor real” corresponde a uma concepção ideal de leitor concreto, ou seja, por oposição ao leitor implicado (v) ou implícito, um modelo de leitor que apenas seja exterior ao texto. Nesse sentido, o leitor real pode ser uma categoria idealizada pelo autor e pela crítica; como o leitor ideal pode corresponder, afinal, a qualquer leitor real, no sentido em que, para alguns teóricos da estética da recepção, é ideal que o leitor faça uso das suas idiossincrasias e preconceitos culturais quando lê, sendo na verdade impossível não o fazer.

{bibliografia}

Hans Robert Jauss, “Literary History as a Challenge to Literary Theory” in Toward an Aesthetic of Reception, University of Minnesota Press (1982); Norman Holland, “Unity Identity Text Self”, Proceedings of the Modern Language Association, 90 (1975); Barbara Herrnstein Smith, “Value/Evaluation” in Frank Lentricchia, Thomas McLaughlin, Critical Terms for Literary Study, The University of Chicago Press (1990).