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Termo
utilizado sobretudo no teatro experimental, onde se resume ao
texto de partida que vai ser representado livremente pelos
actores, e no cinema, onde significa o texto escrito de um
filme, que recolhe os diálogos, a informação sobre os cenários,
os planos das personagens, os ângulos da filmagem, os movimentos
da câmara e todas as indicações técnicas que ajudarão o
realizador e os actores a executar a rodagem do filme.
Distingue-se do argumento, porque este é anterior à concepção do
guião e constitui apenas a matéria exclusivamente literária do
filme, por esta razão é costume publicar-se apenas o argumento
de um filme e não o seu guião. O guião final considera aspectos
técnicos da rodagem do filme que são fundamentais para a boa
execução do projecto, após o qual se há-de proceder à montagem
do material filmado. Ao guião final, como documento de
orientação geral do filme, chama-se

guião
técnico.
Ao longo da história do cinema, são diversas as possibilidades
de autoria do guião, que pode ser assumido pelo próprio
realizador, pelo argumentista ou por alguém próximo do
realizador. O gosto pela improvisão pode eliminar por completo a
presença do guião, como o fez o pioneiro D. W. Griffith, ou
então, num gesto contrário, o guião pode tornar-se uma
planificação rigorosa de todos os passos do filme, sem lugar à
improvisão, como o fez exemplarmente Alfred Hitchcock.

           
No séc. XVI, o guião toma o sentido de «guia, adail, alferes»: «describarão
hos mouros h~ua parede velha, que lhes tomou ho passo de rua,
para que ho Guião de Ioão da nona, per nome Vaqueiro, se detene,
ho que assi fezeram todolos que vinham atras, vendo sobrestar ho
Guião…» (Góis, II, cap. 3, 10). Também nesta altura, o termo
guião significa «pequena bandeira» nas palavras de Diogo de
Couto: «E subindo pelas partes derribadas e entrárão arvorando
logo em cima delle suas bandeiras, e guioen, rodeando-as de huma
boa copia de espingardeiros» (Déc., VI, 3, cap. 2).

           
Actualmente o guião é a base sobre a qual um espectáculo se
compõe, são as palavras que vão traduzir a emoção que definem as
personagens e lhes estabelecem o conflito. Neste sentido o guião
deverá respeitar três qualidades essenciais quanto à sua
elaboração: o logos, pathos e ethos.

Logos corresponde à organização verbal ou estrutura geral do
guião. É a palavra, o discurso e a forma que lhe é dado;
pathos
é o drama humano, é a acção ou conflito do quotidiano
que geram acontecimentos; e ethos corresponde à ética, é
o conteúdo do trabalho ou o significado da estória com a sua
moralidade. Para além destas três características, o guião
obedece a uma construção lógica que passa por cinco etapas: a
ideia, que despertará a motivação para fazer algo a partir dela;
a palavra, que é a ideia anotada numa frase (story-line
ou enredo); o argumento, que é o desenvolvimento do enredo e
onde se começa a delinear as personagens e, principalmente, a
localizar espacial e temporalmente a estória; a estrutura, que é
o modo como vamos contar a estória, é a fragmentação do
argumento em cenas; e guião final, onde se vai preencher a
estrutura atribuindo as emoções, personalidades e conflitos a
cada personagem.

           
No que diz respeito à etapa da palavra, para o trabalho
teórico-prático do guião é necessário saber qual a classificação
pretendida (drama, comédia, etc) para se poder definir a
natureza do enredo. Reportando-nos estritamente ao teatro, o
guião será o seu texto-base através do qual se concretizará toda
a fantasia cénica. Convém, no entanto, fazer a distinção entre o
texto de teatro-objecto literário do autor da peça, e o texto
para teatro- objecto teatral do autor da criação cénica, por
outras palavras, o guião.

O texto
cénico é uma leitura ou uma concretização em palco de
determinado texto literário, sugerido pelo encenador. É um texto
escrito com base em certos códigos teatrais tendo em conta os
hábitos e conhecimentos de determinado público que deverá ser
descodificado e recodificado logo que esteja em frente a um novo
público. E paralelamente ao procedimento teórico, é necessário
que quem escreva o guião tenha perfeita noção do significado de
teatralidade, da perspectiva imediata do objecto-teatro (a forma
da cena, o estilo dos actores, a sua dicção, etc), uma vez que
serão todos estes elementos juntos que irão influenciar o autor
do guião para determinado tipo de escrita.

Quando o
autor do texto para teatro finaliza a sua criação, depara-se,
segundo as palavras de Anne Ubersfeld,  com dois sistemas de
signos linguísticos: «a) l’un les didascalies dont la fonction
est de commander et si l’on peut dire de programer la
construction des signes de la représentation; b) l’autre qui
sera présent scéniquement sous forme phonique (et non plus sous
la forme de signes écrits), et représente le discours qui devra
être tenu sur scéne par les comédians.» (L’École du
spectateur- Lire le théâtre 2
, Éditions Sociales, Paris,
1981, p. 17). Por seu lado, o guião  está presente no interior
da representação sob a forma de voz. Consequentemente, tem dupla
existência: tanto precede a representação como acompanha o seu
desenrolar.

Esta forma
escrita a que chamamos guião trata-se de uma criação muito
efémera. O seu tempo de vida limita-se ao tempo que leva a
converter-se num produto audiovisual. Embora existam vários
guiões editados como objecto literário, o guião propriamente
dito morre assim que dá à luz o espectáculo cénico uma vez que
no teatro, ao trabalhar-se com as emoções, nunca nada se repete.

{bibliografia}

Anne Ubersfeld: L’École du spectateur- Lire le
théâtre 2
(1981);  Anne Ubersfeld: Lire le théâtre
(1977); António Pedro: Pequeno Tratado de Encenação
(1962);