Select Page
A B C D É F G H Í J K L M N O P Q R S T Ü V W Z

Movimento cultural e literário nascido (ou renascido ou continuado, dependendo do ponto de vista histórico que adoptarmos) nos anos 80, nos Estados Unidos, onde surgiu no contexto da repressiva era Reagan, o período em que emerge a lógica do hiperconsumo. O movimento, se tratado como toda a tentativa de escrita experimental, pode ser identificado já antes em muitos textos: Tristram Shandy (1760-67), de Laurence Sterne, Moby Dick (1851) de Herman Melville, Les Chants de Maldoror (1868) de Lautréamont, Finnegans Wake (1939) de James Joyce, Naked Lunch (1962) de William S. Burroughs, Gravity’s Rainbow (1973) de Thomas Pynchon. Podemos ainda alargar a lista  a autores como Apuleio, Rabelais, Sade, Rimbaud, os dadaístas e os surrealistas, Walter Benjamin, Warhol, os situacionistas franceses e a todos os punks e cyberpunks.

O termo Avant-Pop foi primeiro proposto em 1992 por Ronald Sukenick e Larry Mccaffery, a partir de um álbum de jazz de Lester Bowie. O elemento Avant sugere a aproximação com as vanguardas do século XIX; o elemento Pop remete para os movimentos da Pop Art que emergiram em Inglaterra nos anos 50 e depressa contagiaram os Estados Unidos. O conceito está contaminado pelo mesmo estigma revolucionário de outros conceitos contemporâneos como cyberpunk, beatnik poetry (beat generation) ou Generation X, dirigindo a mira para a cultura popular e para todas as convenções estéticas. O termo será inteiramente novo? Não se poderá inscrever na panóplia pós-modernista que inclui a metaficção, a sobreficção e o realismo mágico? A Avant-Pop é tudo aquilo que supera o pós-modernismo ou trata-se apenas de mais um movimento subsidiário do pós-modernismo? A esta questão um avant-popster avançará certamente com um dos seus slogans preferidos: “Hey man, please, No Mo Po Mo!”. Não se perderá na descodificação infrutífera das respostas possíveis à pergunta: “O que é o pós-modernismo?”, mas perguntará sempre: “O que foi o pós-modernismo?” E argumentará da forma mais subversiva que souber que foi menu, dispersão, descentramento, misreadings subtis ou desmistificação do eu, cuja Identidade se tornou plural e perversa (cf. Lance Olsen e Mark Amerika, “Fifty-seven channels and nothin’on”, In Memoriam to Post-Modernism). Neste hipertexto que corre na Internet, pode-se ler uma remix do Manifesto A&P, onde se defende, por exemplo, que o futuro da escrita não está certamente na imagem do escritor solitário sentado perante um teclado que vai compondo uma obra de arte, que depois se há-de apresentar a um editor para eventual publicação e que, por sua vez, o há-de fazer chegar ao público que está predisposto ao consumo literário. O futuro da escrita está antes nas possibilidades multimedia que se abrem à criatividade literária. O escritor do futuro é um navegador do ciberespaço, que tem à sua disposição um público imediato e global. Exige-se então redistribuir a fórmula tradicional: Autor -> Agente -> Editor -> Fotocomposição/ Montagem/ Impressão -> Distribuidor -> Consumidor, para uma fórmula mais simplificada e directa: Autor (Emissor) -> Parceiro interactivo (Receptor). Um avant-popster está apto a invadir selvaticamente o nosso espaço interactivo. Ele gosta de se apresentar como um terrorista cultural ou um voyager  nómada, cuja identidade está em constante trânsito. Combate ainda todas os PO-MOD-SQUADS (literalmente: “os esquadrões pós-modernistas”) que andem pré-ocupados com conceitos de pós-modernismo ou com declarações de morte ao romance ou ao autor e prefere ocupar-se da cultura ocidental, investigando os paradigmas do que se entende por “arte séria”, de quem a produz e do tipo de recepção que tem na sociedade consumista e dominada pelo modem. Na World Wide Web (WWW) ou no Gopher, está disponível uma criação electrónica de Mark Amerika, a Alternative-X, onde se pode contactar com a maior parte da literatura Avant-Pop mais relevante.

A palavra heteroglosa, ou seja, toda a multiplicidade de vozes narrativas que é possível alojar numa só forma, traduz de perto a maior parte das técnicas discursivas utilizadas na ficção avant-pop, que, neste caso, pode transformar-se em FRICÇÃO, isto é, na intersecção e (con)fusão totais de discursos criativos e críticos. Da mesma forma, a ficção avant-pop pode converter-se em FACÇÃO, isto é, na intersecção e (con)fusão de discursos criativos e factos não literários. São marcos da literatura Avant-Pop: The Exaggerations of Peter Prince (1968), de Steve Katz; Empire of the Senseless (1988), de Kathy Acker, considerado o texto anglo-americano mais cyberpunkish e na verdade um plágio parcial e provocante do livro de Gibson Neuromancer; Generation X: Tales for an Accelerated Culture (1991), de Douglas Coupland, um romance de culto desta vanguarda literária. Todos estes textos ilustram (ou pretendem ilustrar) o conceito de hiperficção, que é assumido na (contra)estética Avant-Pop como o género sucessor da sobreficção: esta é essencialmente inventiva e apenas acrescenta algo à realidade, ao passo que a hiperficção é interventiva e interactiva, a exemplo do hipertexto, e procura modificar a realidade.

 

Bibliografia:

 

Larry McCaffery: “The Avant-Pop Phenomenon”, ANQ 5.4 (1992); Larry McCaffery (ed.): Avant-Pop: Fiction for a Daydream Nation (1993); Larry McCaffery e Takayuki Tatsumi: “Graffiti’s Rainbow: Towards the Theoretical Frontiers of ‘Fiction’: From Metafiction and Cyberpunk through Avant-Pop”, Science Fiction Eye, nº12 (1993)

http://www.altx.com/manifestos/avant.pop.manifesto.html

http://www.altx.com/memoriam/

http://www.cafezeitgeist.com/AP.html

http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2565,1.shl