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Conjunto de direitos de natureza pessoal, denominados direitos morais (direito do criador reivindicar a paternidade da obra e de se opor à sua deformação ou mutilação), e de direitos patrimoniais, sendo os primeiros intransmissíveis, mesmo em caso de transmissão total dos segundos, de acordo com o Código de Direito de Autor e Direitos Conexos de 1985, relativo aos autores de obras literárias, artísticas e musicais, aos titulares de direitos em relação a obras cinematográficas, aos produtores de fonogramas, aos organismos de radiodifusão e aos artistas intérpretes e executantes.

A obra intelectual é considerada um bem jurídico e o direito de autor tem a finalidade de garantir ao seu titular a exclusividade da exploração de todas as vantagens económicas que a utilização da obra possa proporcionar. O conceito de obra intelectual é incorpóreo e imaterial, não se devendo confundir com o seu suporte material, o corpus mechanicum.

A especificidade deste direito é ser temporal, passando para a propriedade comum do domínio público no fim de um prazo determinado legalmente, ao contrário de todos os outros direitos de propriedade que são intransmissíveis. A justificação desta temporalidade fundamenta-se no princípio do interesse geral público, contemplado na Declaração Universal dos Direitos do Homem que consagra o direito de acesso da sociedade à informação e à cultura, constituindo este direito o inverso do monopólio da protecção dos criadores. O prazo de protecção dos interesses dos criadores em detrimento do interesse público é de 50 anos após a morte do autor para as obras literárias e artísticas (art. 31º do Código de Direito de Autor e Direitos Conexos, 1985).

O conceito de direito de autor diverge da proposta anglo-saxónica de copyright, que desloca a matriz da protecção da obra para os exemplares em que ela é reproduzida, enquanto o sistema de tradição latina protege o acto imaterial da criação, e uma vez exteriorizada, a obra existe em si mesma, independentemente da sua publicação ou divulgação. Os países da tradição anglo-saxónica de common law consideram os D. A. como uma forma de propriedade, capaz de ser criada tanto por um autor individual como por uma pessoa jurídica, e uma vez criada é susceptível de exploração comercial da mesma maneira que qualquer outra forma de propriedade, estando os direitos que a compõe dirigidos exclusivamente a assegurar o disfrute do potencial económico da dita propriedade. Nos países de sistema continental, o direito de autor também tem características de propriedade da mesma forma que o copyright, mas existe a dimensão adicional, no conceito intelectual e filosófico, de que a obra de um autor é uma expressão da sua personalidade e que requere protecção da mesma maneira que o potencial económico da obra.

As primeiras medidas a favor do direito de autor destinavam-se à protecção dos impressores. A partir do séc. XV, os monarcas passaram a atribuir aos impressores e editores os privilégios de impressão, destinados a protegê-los dos seus concorrentes. O primeiro editor em Portugal a obter o privilégio foi Valentim Fernandes, em 1502, para a sua tradução do Livro de Marco Polo. Em 1537, D. João III outorga, a título de excepção, ao poeta Baltazar Dias um privilégio para imprimir e vender as suas próprias obras.

As primeiras normas jurídicas portuguesas respeitantes à protecção das obras literárias e artísticas surgiram na Constituição de 1838, embora a lei só tenha sido promulgada em 1851, onde se consagrava o direito à propriedade intelectual, fruto da intervenção directa de Almeida Garrett, que foi dos primeiros entre nós a formular uma teoria de raiz liberal do conceito de direito individual do autor, por oposição à ideia de privilégio régio atribuído aos editores. Considerava ele que este direito era intransmissível dentro de um prazo determinado, findo o qual o direito de autor expirava e o da sociedade começava.

É interessante constatar que o escritor Camilo Castelo Branco, cujas obras sofreram diversas contrafacções em Portugal e no Brasil, vivia exclusivamente dos direitos provenientes das suas obras.

Hoje em dia, com o desenvolvimento das novas tecnologias de produção e difusão de informação e a consequente crescente comercialização dos registos, em detrimento das prestações em directo, surgiu um novo termo – direitos vizinhos ou conexos, cujo domínio é protegido pela Convenção de Roma de 1961 e pela Convenção de Bruxelas de 1974.

A protecção das obras noutro país diferente daquele onde a obra foi criada está assegurada por um conjunto de convenções internacionais, das quais se destacam a Convenção de Berna para a protecção de obras literárias e artísticas de 1886, a que Portugal aderiu em 1978, e a Convenção Universal sobre o Direito de Autor de 1952, a que Portugal aderiu em 1979. De entre os princípios gerais, destacam-se o princípio do tratamento nacional – os autores das obras protegidas gozam, em todos os outros países, da mesma protecção que os nacionais desses países, e o da protecção mínima, segundo o qual os estados contratantes devem conceder às obras provenientes de outros estados contratantes protecção, segundo o direito exclusivo de tradução, de representação pública, de radiodifusão, de reprodução sob qualquer forma e de adaptação. Como pré-requisito institui-se que todas as cópias autorizadas, onde quer que publicadas tragam o símbolo Ó, acompanhado pelo nome do proprietário dos D. A. e o ano da primeira publicação. Destaca-se também a Convenção de Estocolmo de 1967 que institui a Organização Mundial de Propriedade Intelectual, organismo responsável pelos principais acordos e convenções internacionais em matéria de propriedade intelectual e industrial, onde Portugal participa em 1975.

A vaga tecnológica desenvolveu inúmeras possibilidades nos domínios da difusão e da reprodução das obras. No domínio da difusão, relevam os problemas da televisão por cabo e por satélite, no da reprodução, as questões da cópia privada e contrafacção, e simultaneamente nos dois domínios a expansão de redes informáticas universais como a Internet.

Contudo, onde a questão dos D. A. se torna mais delicada é na sua relação com a protecção do programa de computador. O direito de autor clássico que contrapunha dicotomicamente obra (literária, estética ou científica) protegida pelo direito de autor, a processo técnico protegido pelo direito da patente, já não se adequa ao programa de computador, que é um instrumento técnico, constituindo parte de uma máquina, mas podendo também ser visto conceptualmente como linguagem e texto. As características técnicas do software também põem em causa o modelo de autor-criador, cuja singularidade aparece diluída numa criação que tende a ser colectiva e integrada numa estrutura empresarial.

Segundo José de Oliveira Ascensão, o direito de autor hoje já não é um direito da criação cultural. O sistema de copyright que ignora os direitos pessoais ou morais de autor, é adequado à tutela de interesses empresariais. Todo o estímulo à produção pertence, não a quem tutela em primeira linha a criação intelectual, mas a quem tutela os interesses empresariais. Hoje assistimos à apropriação do direito de autor pela empresa, o autor está a ser eclipsado, quando não expropriado por esta entidade absorvente. A tutela do direito de autor da obra criada por computador é a manifestação mais flagrante do direito de autor sem autor, que caracteriza a época em que vivemos.

bibliografia

A. de Sá Mello: O Direito Pessoal de Autor no Ordenamento Jurídico Português (1989); Código do Direito de Autor e Direitos Conexos (1985); D. Saunders: Authorship and Copyright (1992); Direito de Autor em Portugal: um percurso histórico, Biblioteca Nacional (1994); José de Oliveira Ascensão: Direito de Autor e Direitos Conexos (1992); Lawrence Venti: “Translation, Authority, Copyright”, The Translator, 1:1 (1995); Luiz Francisco Rebello: Introdução ao Direito de Autor, Vol. I (1994); Martha Woodmansee e Peter Jaszi (eds.): The Construction of Autorship: Textual Appropriation in Law and Literature (1994); M. A. Rocha: Novas Tecnologias de Comunicação e Direito de Autor (1986); Num Novo Mundo do Direito de Autor: Comunicações do II Congresso Ibero-Americano de Direito de Autor e Direitos Conexos (1994); P. Cordeiro e L. R. Helena: Código do Direito de Autor e dos Direitos de Autor (1994); R. R. Bowker: Copyright, Its History and Law (1912).