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1. Figura de retórica que traduz uma dissolução do sentido entre duas ideias ou frases. Trata-se um de uma figura mais radical em termos de ruptura semântica do que outras figuras semelhantes como o adynaton, o equívoco, a silepse ou a anfibologia. No poema “Manucure” (1915), Mário de Sá-Carneiro ensaiou futuristicamente diferentes formas de dissociação (verbal e gráfica).

2. T. S. Eliot popularizou a expressão “dissociação das sensações” (dissociation of sensibility) para traduzir a separação do pensamento em relação aos sentimentos. No ensaio “The Metaphysical Poets” (1921), Eliot considerava esta dissociação o ponto fraco de toda a poesia inglesa desde os poetas metafísicos do século XVII até ao seu tempo (década de 1920). Enquanto os poetas metafísicos conseguiram estabelecer uma harmonia entre o pensamento e os sentimentos (unified sensibility), a partir de Milton e Dryden essa harmonia desfez-se irremediavelmente. A chamada Escola de Cambridge e os primeiros pensadores do New Criticism seguiram de perto esta ideia. Os críticos de Eliot discordam desta simplificação da história da poesia, por se tratar de uma forma unicamente de defesa pessoal da sua própria poesia.

3. O encadeamento lógico de juízos apodícticos que é próprio da crítica literária não pode ser totalmente realizado sem a intervenção da imaginação construtiva, que se forma a partir de um jogo cognitivo de dissociação e associação. Para ler criticamente um texto é necessário formar combinações novas com elementos antigos, isto é, precisamos de dissociar primeiro os dados registados da memória, desagregando-os, a fim de poderem ser associados numa nova ordem. Dissociar significará, neste sentido de uma situação crítica ideal, libertarmo-nos de todas as ideias pré-concebidas para abrir caminho a todas as associações logicamente possíveis. Reflecte de alguma forma um despojamento cognitivo sem o qual não se pode ter acesso ao verdadeiro conhecimento do texto. É preciso esquecer para dizer algo de novo – eis um princípio elementar da crítica literária. Ora, é a originalidade e a fecundidade das associações que determina o exercício crítico como faculdade criadora, tal como é no poder de dissociação e associação dos dados da memória transpostos para o texto que se funda tal faculdade.