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Conceito que remete para os termos ou enunciados que tenham sentidos opostos, sendo ambos válidos. Trata-se de uma forma particular de ambiguidade. O termo foi proposto pelo psicanalista Eugen Bleuler (Vortrag über Ambivalenz, 1910) e foi depois redefinido por Freud. Está ligado na origem às atitudes e comportamentos humanos. Ocorre na atribuição de sentimentos opostos ao mesmo indivíduo. Casos comuns são os da ambivalência da aceitação e da rejeição, do amor e do ódio pela mesma pessoa: “Ah Não possa eu saber se amor ou se odeio” (Racine, Andrómaca, V, 1). Na interpretação dos sonhos, verifica se também que certos quadros possuem uma dupla significação: aqueles que despertam ao mesmo tempo o medo e o desejo de um mesmo objecto, por exemplo.

A ambivalência pode ser compreendida na relação entre os foros literário e psicológico: assim o caso de Mário de Sá Carneiro na situação intersubjectiva de Eu Próprio o Outro ou o caso de Álvaro de Campos, que encontramos com frequência em situações ambivalentes do tipo: “Há entre quem sou e estou / Uma diferença de verbo / Que corresponde à realidade.” (“Não: devagar”, nº 209, Livro de Versos, ed. crítica de Teresa Rita Lopes, 1993). De um ponto de vista estritamente literário, a ambivalência pode funcionar como uma figura de retórica, como nesta abertura do Sermão da Sexagésima, de António Vieira: “Vós, diz Cristo Senhor nosso, falando com os Pregadores, sois o sal da terra”, em que o vocativo ambivalente “Vós” tanto se refere aos Pregadores de Cristo como, implicitamente, aos interlocutores de Vieira no momento em que o sermão é pronunciado, neste caso, os religiosos do Maranhão.

Há ainda um caso particular de ambivalência que não se reporta à personalidade ou a questões semânticas. Trata se da ambivalência sociológica que diz respeito à estrutura social: “Num sentido mais amplo, a ambivalência sociológica reporta se a expectativas de atitudes, crenças e comportamentos incompativelmente normativos, atribuídos a um status (isto é, uma posição social) ou a um conjunto de status numa sociedade. Num sentido mais restrito, a ambivalência sociológica reporta se a expectativas normativas incorporadas num único papel de um único status social (por exemplo, o papel terapêutico do médico em distinção de outros papéis do seu status, como pesquisador, administrador, colega de profissão ou membro da associação profissional, etc.).” (Robert K. Merton, A Ambivalência Sociológica e Outros Ensaios, Zahar Ed., Rio de Janeiro, 1979, p.19).

 

Bibliografia:

 

Alfred Hoelzel: “The Conclusion of Goethe’s Faust: Ambivalence and Ambiguity“, The German Quarterly, 55, 1 (Cherry Hill, NJ, 1982); Arnold S. Edelstein: «The Triumph of Fantasy: Ambiguity and Ambivalence in the Fiction of Henry James», tese de doutoramento (Univ. da Califórnia, Berkeley, 1972); Candace Slater: “Women, Men, and Ambivalence within the Brazilian Literatura de Cordel”, in Carmelo Virgillo e Naomi Lindstrom (eds.): Woman as Myth and Metaphor in Latin American Literature (1985); Françoise L. Simon-Miller: “Ambivalence and Identification: Freud on Literature (Part I, Part II)”, Literature and Psychology, 28 (Teaneck, NJ, 1978); Gerald E. Enscoe: “Ambivalence in ‘Kubla Khan’: The Cavern and the Dome”, Bucknell Review, 12, 1 (1964); Joan Hoberg Petersen: “Ambivalence ou ambiguité? Analyse de deux romans de La comédie Humaine”, Revue Romane, 8 (Kobenhavn, Dinamarca, 1973); John Paul Riquelme: “The Ambivalence of Reading”, Diacritics, 10, 2 (1980); Juan A. Prieto Pablos: “The Ambivalent Hero of Contemporary Fantasy and Science Fiction”, Extrapolation: A Journal of Science Fiction and Fantasy, 32, 1 (Kent, 1991); Robert K. Merton: A Ambivalência Sociológica e Outros Ensaios (1976); Samuel Weber: “Ambivalence, the Humanities and the Study of Literature”, Diacritics, 15, 2 (1985).