Select Page
A B C D É F G H Í J K L M N O P Q R S T Ü V W Z

Termo cunhado por Jacques Derrida, no interior da sua teoria sobre uma gramatologia aplicada, que é uma espécie de ciência geral da escrita, e que resiste a uma definição fixa. Derrida rejeita a ideia de se tratar de um conceito aplicável. A desconstrução propõe uma nova forma de pensar e formular a escrita, mas não quer colocar em seu lugar outra formulação definitiva. A arquiescritura deve estar sujeita a uma investigação contínua. Assim sendo, quando falamos de arquiescritura falamos da escrita que precede a fala e nela se concretiza. Não se trata da definição tradicional da escrita como registo gráfico nem se pressupõe a referência a um mundo exterior ou ulterior ao texto. É ao que sobrevive a estes limites tradicionais de significação que Derrida chama arquiescritura. Derrida afasta-se do privilégio que Platão concedeu à fala em relação à escrita (fonocentrismo) e propõe uma visão contrária: toda a linguagem é uma espécie de escrita (arche-écriture), o que pressupõe que a filosofia seja também uma espécie de escrita. Por esta razão, Derrida chega a admitir que mesmo a própria linguagem falada seja incluída na ideia de arquiescritura. O exemplo de Derrida é o de uma gravação audio que pode ser considerada igualmente uma forma de escrita (cf. “ ‘Excuse me, but I never said exactly so’: Yet Another Derridean Interview”, 1983, http://www.cas.usf.edu/journal/fobo/so.htlm).

Uma das principais conclusões da leitura que Derrida faz de Rousseau traz-nos o que “resta” à escrita depois das definições padronizadas: “(….) para além do que se acredita poder circunscrever como a obra de Rousseau, e por detrás dela, nunca houve senão a escritura; nunca houve senão suplementos, significações substitutivas que só puderam surgir numa cadeia de remessas diferenciais, o “real” só sobrevindo, só acrescentando-se ao adquirir sentido a partir de um rastro e de um apelo de suplemento” (Gramatologia, trad. de Miriam Schnaiderman e Renato J. Ribeiro, Ed. Perspectiva, São Paulo, 1973, pp.194-195). A arquiescritura é, portanto, o que consegue romper os limites do registo gráfico da linguagem.

O ensaio de Derrida “Freud et la scène de l’écriture” (in L’Écriture et la différence, 1967) comenta os mecanismos metafóricos que Freud utiliza para descrever o inconsciente como portador de uma escrita sob a forma do que se pode chamar arquiescritura. Esta precede toda a escrita gráfica e física e mesmo toda a fala. Como afirma Derrida, “L’écriture supplée la perception avant même que celle-ci ne s’apparaisse à elle-même. La ‘mémoire’ ou l’écriture sont l’ouverture de cet apparaître lui-même. Le ‘perçu’ ne se donne à lire qu’au passé, au-dessous de la perception et après elle.” (L’Écriture et la différence, Éditions du Seuil, Paris, 1967, p.332). Esta arquiescritura que precede a fala só pode ser reconhecida por marcas e diferenças.