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Teoria literária assente em teorias construtivistas do conhecimento, proposta em Grundriss der Empirischen Literaturwissenschaft (1980; 1982) por Siegfried J. Schmidt. Foi divulgada pelas traduções de R. de Beaugrande (1982) e F. Chico Rico (1991). No quadro da IGEL (Internationale Gesellsschaft für Empirische Literaturwissenschaft), fundada por Schmidt em 1987, foi proposta a designação “Empirical and Systemic Approach to Literature (SEAL)”.

A CEL foi elaborada no quadro da investigação inter- e transdisciplinar realizada pelo grupo NIKOL. Esta equipa foi fundada e dirigida por Schmidt, em 1973, na Universidade de Bielefeld. Integraram-na W. Kindt, J. Wirrer e R. Zobel e P. Finke que desenvolveu uma teoria científica da Literatura, fundamentando os seus valores metateoréticos básicos: a teoreticidade, a empiricidade e a aplicabilidade. O grupo NIKOL, agora constituído por A. Barsh, H. Hauptmeier, D. Meustch, G. Rusch e R. Vieohff, entre outros, prossegue a sua actividade na Universidade de Siegen, no Instituto LUMIS, também fundado e dirigido por S.J. Schmidt.

A CEL teve como objectivo inicial a fundamentação de uma ciência normal da actividade literária (sensu Kuhn), como alternativa à hermenêutica literária, agressivamente contestada. Partindo das concepções de N. Luhmann (1970) sobre a sociedade entendida como “um sistema de interacções comunicativas”, a LITERATURA (razões de ordem teórica justificaram o recurso às maiúsculas) define-se como um subsistema social autónomo, sujeito a regras e a convenções específicas que o delimitam: as convenções Estética e da Polivalência. os papéis necessários ao funcionamento auto-regulado do subsistema LITERATURA são: a Produção, a Mediação, a Recepção, o Pós-processamento ou Transformação de Bases Linguísticas de Comunicado em Comunicados aceites como Comunicados literários, por peritos e/ou por leitores comuns. A CEL assenta no pressuposto básico da separação clara entre a pesquisa científica e a participação na LITERATURA, que inclui a crítica e a interpretação desses COMUNICADOS. Numa primeira fase, foram tratados aspectos sincrónicos da “actividade literária”. numa segunda fase, e no âmbito de uma teoria historiográfica construtivista (ainda in fieri), foram abordados aspectos diacrónicos das relações entre a LITERATURA e outros subsistemas sociais (Schmidt, 1989).

O principal objecto de estudo da CEL é a conduta dos intervenientes “como seres vivos, i.e., como unidades históricas” (Schmidt, 1997:8), no desempenho dos papéis acima referidos. Dada a sua condição de sistemas humanos autopoiéticos capazes de auto- e de hetero-observação, a problemática da compreensão dos textos literários e da construção individual de sentido tem sido exaustivamente explorada, à luz dos contributos da “nova” Psicologia. No mesmo quadro, o estudo dos textos ocupa, agora, lugar proeminente na CEL.

A análise empírica intervém como método capaz de garantir a discussão intersubjectiva dos factos e dos resultados obtidos, tendo em conta o pressuposto maturaniano das modificações introduzidas pelos observadores nos objectos observados. Nesta linha, os conceitos de “sistema” e de “observador” têm sido abundantemente tratados por Schmidt, que tem vindo a reaproximar-se de E. von Foerster, de E. von Glasersfeld e de G. Roth (teoria biológica da cognição). Schmidt, (1997:16) reclama-se do Construtivismo radical tal como foi definido por Glasersfeld, em conformidade com a posição de Maturana, assim enunciada: “Tudo o que é dito, é dito por um observador”.

No estado actual da investigação realizada pelo grupo de Siegen e por especialistas de áreas diversas, considera-se que, no subsistema LITERATURA, intervêm processos transaccionais desencadeados pelo COMUNICADO LITERÁRIO, pelos receptores e pelas situações em que se realizam formas diversas de cooperação potenciadas pelos géneros do discurso produzidos (Vipond e Hunt, 1989); o pensamento de M. Bakhtin tem sido convocado por R. Hunt (1992). A problemática ligada à historiografia construtivista vem a ser debatida desde 1985, com destaque para Rusch, Schmidt e Berg.

A CEL propõe a integração dos Estudos Literários numa teoria geral dos media, defendendo a Literatura como subsistema socialmente indispensável, autónomo e específico. Resultante de acopulamentos estruturais entre agentes humanos actuando em esferas e níveis diversificados de acção literária e extra-literária (Barsch, 1995), a Literatura constitui um instrumento eficaz na formação da identidade pessoal e comunitária, bem como um laboratório insubstituível de experiências vivenciais (Viehoff, 1995).

A CEL, sem abdicar da homogeneidade epistémica, teórica, metodológica e prática, exigível a qualquer modelo de investigação científica, tem mantido a difícil aposta na transdisciplinaridade, continuando, simultaneanmente, a defender a investigação empírica, na esteira de J. Sneed e de W. balzer (ap. Schmidt,1991), como instrumento de organização e interpretação de dados empíricos conducentes à avaliação intersubjectiva dos pressupostos e posições de um paradigma assente na explicitação de pressupostos, teorias, métodos e práticas. Daí a opção pelo Construtivismo e pelo empirismo — conceitos aparentemente contraditórios e em rota de colisão — que tem alimentado vivos debates entre posições epistemológicas e teóricas diversas e/ou opostas.

A CEL, gerada no quadro da linguística textual e da pragmalinguística, é credora dos trabalhos de N. Groeben e T. Wolff; de R. Barthes; J. Piaget, E. von Glasersfeld e H. von Foerster; N. Luhmann, H. R. Maturana e P. M. Hejl, que formulando o conceito de sinreferencialidade, auxiliou a solução de alguns problemas suscitados pelas concepções neurofisiológicas de Maturana. Inicialmente alvo de contestação (Schmidt, 1994), a CEL ocupa, uma posição minoritária na comunidade académica internacional, situação que poderá vir a modificar-se, tendo em conta o valor e a quantidade dos trabalhos realizados cuja recepção e divulgação está em curso. O acolhimento recebido deve-se à defesa fundamentada e à revisão crítica dos pressupostos metateoréticos , teóricos e metodológicos do modelo schmidtiano, à capacidade de integrar desenvolvimentos recentes na teoria do discurso, da sociologia do conhecimento, da história das mentalidades e da micro-história, o que pode auxiliar à construção de uma Ciência Literária Geral e Comparada, capaz de formar profissionais competentes em campos de actividade literária e extra-literária (Schmidt, 1991). Na Alemanha, ao cabo de um trabalho aturado e persistente, a CEL é hoje reconhecida através dos diversos projectos de investigação realizados nas áreas da Literatura, das Artes e dos Media.

bibliografia

Colin. B. Grant: Entrevista com Siegfried J. Schmidt sobre os fundamentos cognitivos e a relevância social da Ciência da Literatura, Forum Deutsch, 2 (1997); F. Chico Rico (ed.): Teoría/Crítica, número especial sobre A Ciência Empírica da Literatura, vol. 2 (1995); trad. esp. por F. Chico Rico: Fundamentos de la ciencia empírica de la literatura. El ámbito de actuación social LITERATURA (1991); id.: Grundriss der Empirischen Literaturwissenschaft. Zur Rekonstruktion Literaturwissenschaft Fragestellungen in einer ETL (1982); id.: ” ‘System’ and ‘observer’: two key concepts in (future) literary studies”, LUMIS, 39 (1994); Siegfried J. Schmidt: Grundriss der Empirischen Literaturwissenschaft (Konzepte Empirischer Literaturwissenschaft, Bd.1, teil 1 (1980), trad. ingl. por R. de Beaugrande: Foundations for the Empirical Study of Literature — The Components of a Basic Theory (1982).