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Os dumb shows encontram-se na linha dos quadros dramáticos medievais representados nos adros das igrejas e dos pageants. Inicialmente, as personagens eram alegóricas e as histórias em mímica versavam temas de comerciantes burlões, demónios e assuntos bíblicos, como o dilúvio. Assiduamente, o dumb show tinha acompanhamento musical e podiam ser utilizados fantoches e bonecos. “It [music] accompanied all the most emotional passages, solemn meditation, religious ceremonies, dumb shows, tableaux, love scenes” (Themes and Conventions of Elizabethan Tragedy, C.U.P., Cambridge, 1980, p. 20). Abrams define o termo como “an episode of pantomime, introduced into a spoken play”( A Glossary of literary terms, Holt, Rinehart and Winston, Forth Worth, 1985, p.126), traduzindo a ideia de imitação do próprio procedimento teatral. O silêncio é a característica fundamental deste método dramático aproximado da pantomima. Temporalmente, já em Florença, no século XIV, e na Inglaterra Tudor, se realizavam dumb shows alegóricos. No reinado da rainha Anne, há notícia de na Feira de S. Bartolomeu ter havido uma representação, “The Creation and the Flood”, seguido de um espectáculo com o nome Punch and Sir John Spendall. “At Bartholomew Fair in the reign of Queen Anne, a performance of the Creation and Flood was followed by a puppet show called Punch and Sir John Spendall. In it Punch beat his wife, insulted the priest, was frightened by a ghost and was finally carried off to hell” (http://www.imagi-nation.com/moonstruck/ spectop006.html).

Trata-se de uma forma de convenção, definida por Bradbrook como “an agreement between writers and readers (or spectators), whereby the artist is allowed to distort and simplify his material through a control of the distribution of emphasis” (Themes and Conventions of Elizabethan Tragedy, C.U.P., Cambridge, 1980, p.3). O dramaturgo podia assim manipular a acção, dado que os dumb shows podiam constituir-se como cenas dilatórias ou como cenas que acelerassem o desenlace da intriga (muitas vezes cenas longas eram encurtadas pela transposição para um dumb show). De facto, inúmeros críticos apontam o uso do dumb show como um artifício fácil que primava pela sua espectacularidade e que contribuía para a desordem e inconsistência da intriga. Por volta de 1620, à semelhança de outras convenções do teatro isabelino, o dumb show torna-se obsoleto e cai em desuso.

Inseridos em peças isabelinas, os dumb shows tornaram-se parte integrante da peça e ocupavam uma posição variável ao longo da representação teatral, organizando-se quer como prólogos quer como divisão entre actos ou mesmo surgindo durante actos. Em Gorboduc (1562), de Thomas Norton e Thomas Sackville, representada no Inner Temple durante as celebrações do Natal de 1562, cada dumb show precedia um acto, simbolizando uma moral que era retomada e desenvolvida pelo coro.

Quanto à sua função, os dumb shows geralmente preparavam os espectadores para a acção principal que se seguiria, tal como no famoso dumb show em Hamlet, que constitui um prelúdio à play within a play dado que as acções do dumb show são repetidas por palavras imediatamente a seguir. Este procedimento efectivava uma economia do discurso dramático: permitia ao dramaturgo variar o enredo da peça sem acrescentar diálogo e tornava possível apresentar ao público e aos actores em palco acontecimentos que espacialmente diferiam da localização da cena em palco. Tal é verificável em The Battle of Alcazar (1594), de Peele, e em Friar Bacon and Friar Bungay (1594), de Greene, na qual dois jovens através do óculo mágico de Bacon tomam conhecimento do encontro entre seus pais e do seu assassinato. “The dumb show might be only an economic and more vivid way of giving events than by conversation between first and second gentlemen” (Themes and Conventions of Elizabethan Tragedy, C.U.P., Cambridge, 1980, p. 43) e, de facto, Middleton, em The Changeling, serve-se deste procedimento com o intuito de representar detalhes necessários ao desenvolvimento da intriga que seriam entediantes se apresentados em palco.

Quanto à encenação em palco do dumb show, os actores eram obrigados a exagerar as suas posturas corporais e as expressões faciais para a acção representada ser inteligível e a música ajudaria a prender a atenção da assistência em dumb shows mais prolongados. A espectacularidade dos dumb shows podia ser muitas vezes a chave para o sucesso da peça. M.C. Bradbrook refere que, nesta linha de dumb shows que primavam pela espectacularidade, incluem-se os “bloody banquets”. “There was a dumb show of particular horror known as “the Bloody banquet” (…). It was rather like the Thyestean feast: the table was set with black candles, drink set out in skulls and the Furies served it up. (…) A great deal of painstaking and elaborate work went to the staging of atrocities” (Themes and Conventions of Elizabethan Tragedy, C.U.P., Cambridge, 1980, p. 19).

Quanto aos tipos de dumb show, para além de poderem ser parte integrante e subsidiária da intriga (como o dumb show em Hamlet) ou de, pelo contrário, terem um lugar acessório em relação à acção (como o uso do dumb show em The Spanish Tragedy), revestiam-se ou de um carácter de reconhecimento, premonição ou serviam como introdução. No primeiro caso, veja-se o dumb show em Hamlet, pelo qual Claudius se reconhece como alvo de acusações; no segundo é de salientar o Hymen dumb show em The Spanish Tragedy e, no terceiro caso, é de salientar Thomas Dekker em The Whore of Babylon (1607). Também John Webster em The Duchess of Malfi (1613-4), apresenta dois dumb shows introdutórios, representado a investidura do cardeal e a expulsão da duquesa e da família.

Inúmeros exemplos de dumb shows famosos podem ser encontrados em peças como Macbeth (1606), de William Shakespeare, The Spanish Tragedy (c.1587), de Thomas Kyd, Doctor Faustus, de Christopher Marlowe, The Battle of Alcazar (1594), de Peele, James the Fourth (1591), de Robert Greene, e em Malcontent (1604), de John Marston entre outras.

Bibliografia:

A.K. Mcllwraith (ed.): Five Elizabethan Tragedies -Thyestes, Gorboduc, The Spanish Tragedy, Arden of Feversham, A Woman killed with Kindness (1976); Dieter Mehl: The Elizabethan Dumb Show. The History of a Dramatic Convention. (1965); M. C. Bradbrook: Themes and Conventions of Elizabethan Tragedy (1980); M.H. Abrams: A Glossary of Literary Terms (1985).