Select Page
A B C D É F G H Í J K L M N O P Q R S T Ü V W Z

No âmbito do New Criticism, registou-se um movimento de dissidência que ficou conhecido pelo nome de Escola de Chicago, aparecida nos finais dos anos 30 na Universidade de Chicago, sob  a liderança de Ronald S. Crane que organiza a obra colectiva: Critics and Criticism, Ancient and Modern (1952), onde se reabilita a retórica antiga e se focaliza a importância do enredo (plot) nas obras de ficção. A Escola de Chicago começa compartilhando uma série de pontos de vista do New Criticism, mas evolui para uma posição totalmente antagónica àquela corrente, chegando a minimizar a importância das formas linguísticas (negando, com isso, a base do sistema do New Criticism), pondo em seu lugar as categorias de selecção, personagem e pensamento, todas de procedência aristotélica. A forte influência de Aristóteles contribuiu para que a escola também ficasse conhecida por Aristotelismo de Chicago ou Neo-aristotelismo de Chicago.

Um dos aspectos que mais interessa aos críticos de Chicago recuperar na Poética de Aristóteles é o facto de aí se explicar o fenómeno literário como um acto de vontade do homem, por outras palavras, o sentido do texto literário é o resultado de uma intenção única que precede a criação textual. No modelo aristotélico, ficam de fora as interpretações motivadas por influências sociais e/ou psicológicas. Se assim fosse, apenas nos interessaria saber em que condições os dramaturgos e os poetas gregos antigos e clássicos escreveram as suas obras, que motivações extratextuais os levaram a escrever (por exemplo, vencer um prémio literário num festival). Mas o que importa a um verdadeiro teórico da literatura é reflectir sobre as escolhas realizadas pelos autores para produzirem uma obra de arte e não as suas motivações psicológicas ou sociais. No fundo, tratava-se de saber avaliar o engenho dos escritores na concretização das suas intenções estéticas. Uma forma de mostrar a importância e intemporalidade deste método é lembrar a estratégia crítica dos iluministas franceses e ingleses que procuraram conhecer os escritores o melhor possível, tentando ver que meios técnicos é que utilizaram para alcançar os fins a que se propuseram. São exemplos deste método An Essay on Criticism, de Alexander Pope, e Preface to Shakespeare, de Samuel Johnson.

A escola de académicos de Chicago que floresce na década de 50 vai destacar precisamente a importância da crítica literária na construção de uma teoria da literatura devidamente fundamentada na intenção autoral como caminho para uma interpretação “objectiva” da obra literária. De notar que o New Criticism inicial havia negligenciado a importância da poética tradicional para privilegiar um método que reduzia o sentido do texto literário a uma “mensagem” susceptível de ser parafraseada. Agora impunha-se reavaliar o grande valor da Poética de Aristóteles para o estudo da literatura, porque esta obra de referência maior permitia ainda considerar os textos literários na sua diversidade de género sem partir do princípio de que todos os textos eram construídos segundo regras universais únicas.

R. S. Crane insistia na necessidade de transformar a crítica literária numa espécie de inquérito (no sentido filosófico da palavra), que combinaria o conhecimento da história, a capacidade de determinar a lógica dos textos e a própria especificidade da escrita efectiva desses textos. No artigo, “Criticism as Inquiry; or, The Perils of the ‘High Priori Road’ “, Crane propõe não só uma nova abordagem do texto literário como deixa bem claro o que o separa do New Criticism: “My first complaint, then, against the persons most actively concerned in the revival of criticism in the universities is that many of them have done criticism, as well as historical scholarship, a bad service by continuing to talk in terms of the antithesis between the two which perhaps had some rhetorical or political justification two decades ago, but surely no other justification then or since. There can be no adequate criticism that is not solidly based on the history of the art with which it is concerned.” (in The Idea of the Humanities and Other Essays Critical and Historical (vol.2), Chicago, 1967, p.26). Para R. S. Crane e para Elder Olsen o importante era recuperar a autoridade do autor na determinação do sentido do texto literário.

Um dos críticos americanos que mais ficou a dever à intervenção da Escola de Chicago é Wayne C. Booth, que também recuperou as teorias de Aristóteles aplicadas à literatura, em particular na obra The Rhetoric of Fiction (1961), onde critica a utilização de prescrições críticas para o estudo da ficção, que o New Criticism havia pré-determinado com leis rígidas de leitura, que implicava uma quase total omissão dos comentários autorais. Tomando o conceito de retórica não no seu sentido clássico mas no sentido de um conjunto de técnicas e mecanismos ao serviço do autor para controlar a comunicação com o leitor, a teoria da ficção de Booth assenta no respeito por três valores fundamentais:  “The values which interest us, and which are thus available for technical manipulation in fiction, may be roughly divided into three kinds. (1) Intellectual or cognitive: We have, or can be made to have, strong intellectual curiosity about ‘the facts’, the true interpretation, the true reasons, the true origins, the true motives, or the truth about life itself. (2) Qualitative: We have, or can be made to have, a strong desire to see any pattern or form completed, or to experience a further development of qualities of any kind. We might call this kind ‘aesthetic’, if to do so did not suggest that a literary form using this interest was necessarily of more artistic value than one based on other interests. (3) Practical: We have, or can be made to have, a strong desire for the success or failure of those we love or hate, admire or detest; or wc can be made to hope for or fear a change in the quality of a character. We might call this kind ‘human’, if to do so did not imply that 1 and 2 were somehow tess than human….” (2ª ed., Chicago University Press, Chicago, 1983, p.125). Outro teórico americano, H. D. Hirsch, Jr., autor de Validity in Interpretation (1967) e The Aims of Interpretation (1976), continuará a insistir no pressuposto de validar como objecto de abordagem textual unicamente a intenção do autor, levantando questões do tipo: O autor está consciente da intenção que lhe atribuída na criação literária? O sentido autoral varia com o tempo? Resiste-lhe? Como saber que o sentido que atribuímos a um texto corresponde à intenção do seu autor? De notar que esta insistência ocorre num momento em que se assiste ao crescimento internacional de teorias que defendem precisamente o contrário: o sentido do texto está antes dependente da arbitrariedade ou do engenho do leitor, do género subjacente ao texto, das condições sociais de produção da obra de arte literária, dos compulsões individuais, etc.

Bibliografia:

Bernard Weinberg: “From Aristotle to Pseudo-Aristotle”, in Aristotle’s Poetics and English Literature, ed. por Elder Olson (1965); Elder Olson: On Value Judgments in the Arts and Other Essays (1976); Eliseo Vivas: “The Neo-Aristotelians of Chicago”, Sewanee Review, 61 (1953); Gerald Graff: Professing Literature: An Instituional History (1987); Hoyt Trowbridge: “Aristotle and the ‘New Criticism’, Sewanee Review, 52 (1944); John Crowe Ransom: “Humanism at Chicago”, Kenyon Review, 14 (1952); Lee T. Lemon: The Partial Critics (1965); Murray Krieger: The New Apologists for Poetry (1956); Richard McKeon: “Criticism and the Liberal Arts: The Chicago School of Criticism”, Profession 82 (1982); Vicent B. Leitch: American Literary Criticism from the Thirties to the Eighties (1988); Wayne C. Booth: Critical Understanding: The Powers and Limits of Pluralism (1979); William K. Wimsatt: “The Chicago Critics: The Fallacy of Neoclassic Species”, in The Verbal Icon: Studies in the Meaning of Poetry (1954).