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Os estudos sobre os homens são uma área em ascensão e que, provindo dos estudos femininos ou sobre as mulheres, contemplam a análise do papel e dos retractos das figuras e papéis masculinos das produções literárias e também culturais.

Os papéis masculinos mais proeminentes desde sempre na história poderão ser as representações dos heróis shakesperianos e dos anti-heróis dos romances do siglo de oro espanhol, pois muitos se regiam por marcadas representações de elementos ‘bons’ e ‘maus’. Mais tardiamente – e mais notoriamente como men’s studies – é de interesse analisar as representações vitorianas e imperiais de modelos masculinos (RAMOS 2011: 86), pois, dado o poder imperial supremo da Grã-Bretanha como colonizador, eram necessárias representações do masculino que revelassem, acima de tudo, liderança, poder, cultura e experiência,

Colonial masculinity was also structured around established categories, notwithstanding its versatility and pragmatic role-playing. The Empire relied on this manpower to serve as leaders, administrators, soldiers, explorers, entrepreneurs. Therefore, masculinity in the Age of Empire was embodied by the “Imperial man”. (RAMOS 2011: 87-88)

mesmo ainda posteriormente moldando o conceito até termos militaristas e guerrilheiros, direccionando desde cedo as crianças a tornarem-se em figuras masculinas previstas e pré-estabelecidas, tendo em conta toda a pluralidade das representações possíveis de masculinidade – idade, físico, orientação sexual, educação e cultura –, mas sempre incutindo os valores de uma imperial manliness, de “training boys to be healthy in body and pure in mind (…) to grow into ‘manly men’” (RAMOS 2011: 89), filosofias pelas quais são representados, por exemplo, os Escuteiros e o Salvation Army e até na literatura juvenil, como Treasure Island (1881-82), de Robert Louis Stevenson, e King Solomon’s Mines (1885), de Henry Rider Haggard. No final, esperava-se que o “herói” regressasse a casa ileso, mas sempre preparado para lutar contra tudo e todos em nome da Rainha e do Império. Estes exemplos denotam as construções socioculturais identitárias de ambos os sexos, visto que o masculino foi sempre associado a poder, agressividade, competição, austeridade e administração (BEYNON 2002: 161-163).

Contudo, já os colonizados eram vistos no sentido oposto: efeminados, fracos, selvagens; assim, pode-se entender a existência de um Oriente repleto de perigos, desconhecido e monstruosidade, contrastando imediatamente com os colonizadores e com as suas origens. Igualmente, intensificou-se a definição do papel do elemento feminino em casa, do modo mais conservador possível.

Quanto ao Gótico, o masculino apresenta-se como algo dúbio, pois revela poder e frieza, mas ao mesmo tempo consegue cair no descontrolo do terror e da escuridão, não sendo imune ao poder superior psicológico do escuro:

Gothic Masculinity complicates conceptual masculinity, engendered by the dual sex, separate-sphere gender ideology of the late eighteen and early nineteenth centuries, by examining the influences of an alternative and threatening homo-social/sexual male figuration. (PURINTON 2005: 656-657)

Na época contemporânea, Edwards defende uma tripartição dos estudos do masculino, onde todas elas são influenciadas pelos media, pela literatura, incidindo essencialmente na condição em que se posicionam os elementos masculinos, e pela teoria culturalista:

As is also the case with feminism, it is less easy to define, often slipping across interdisciplinary lines and invoking literary, cultural and media studies alongside the work of social scientists. (EDWARDS 2006: 2)

Primeiramente, temos os anos ’70 (do século XX), onde se desenvolve o paradigma dos papéis dos sexos através de construções e representações sociais; em seguida, os anos ’80, com uma crítica a esse mesmo desenvolvimento pela limitação dos papéis e da sua ambiguidade; e, por último, através da teoria pós-estruturalista, com os estudos sobre o feminino e estudos feministas, onde se discutem políticas de representações sexuais e construções identitárias, o que levou à resposta masculina – a génese de estudos sobre os homens e o masculino relativamente às suas posições e às projecções das suas representações tanto na literatura, como na cultura, onde se estabelece como algo importante o modo de representação.

Contudo, os estudos sobre os homens apenas surgiram na década de 1970, provindo dos women studies. Geraram-se ainda os queer studies, tratando especificamente dos temas relativos às várias representações possíveis de homossexualidade, demarcando-se diferentemente do masculino e do feminino – ou seja, demarcando um espaço algo ambíguo –, mas quase sempre de modo a conter nela várias representações efeminadas (EDWARDS 2006: 70).

É importante referenciar a representatividade dos estudos sobre os homens nas universidades. Embora se encontrem ainda em ascensão, em algumas instituições universitárias já existem unidades curriculares e/ou cursos relativos a estudos sobre os homens, incidindo sobre masculinidades, gender stuggles e body politics. Este interesse pela área dos men’s studies proveio de um demarcado movimento de masculinidades, como uma contradição aos women’s studies – ou estudos sobre as mulheres –, debatendo as diferenciações entre os conceitos de masculino e feminino.

{bibliografia}

Beynon, John. Masculinities and Culture. Buckingham: Open University Press, 2002.

Boehmer, Elleke. Colonial and Postcolonial Literature – Migrant Metaphors. Londres: Oxford University Press, 2005 (1995).

Edwards, Tim. Cultures of Masculinity. Londres: Routledge, 2006.

Pinto Coelho, Maria Teresa. Ilhas, Batalhas e Aventura: Imagens de África no Romance de Império Britânico do Último Quartel do Século XIX e Início do Século XX. Lisboa: Edições Colibri, 2004.

Purinton, Marjean D. “Gothic Masculinity: Effeminacy and the Supernatural in English and German Romanticism by Ellen Brinks”, em Studies in Romanticism, Vol. 44, No. 4. Versão digital, Boston: Boston University, 2005. Pp. 654-657. Recensão disponível em: <http://www.jstor.org/stable/25602028>, consultado em Janeiro de 2013.

Ramos, Iolanda. “Between Heaven and the Garden: Some Female Roles in the Victorian Age”, em Revista Anglo-Saxónica, Série II, Número 21. Lisboa: Edições Colibri, 2004. Pp. 159-169.

Ramos, Iolanda. “Manliness, Character and the Making of the British Empire”, em Revista Anglo-Saxónica, Série II, Número 19. Lisboa: Edições Colibri, 2003. Pp. 67-74.

Ramos, Iolanda. “New Imperialism, Colonial Masculinity and the Science of Race”, em Empire Building and Modernity. Lisboa: ULICES-CEAUL, 2011. Pp. 81-105.