Select Page
A B C D É F G H Í J K L M N O P Q R S T Ü V W Z

Figura de pensamento que consiste na amplificação crescente, quer por excesso quer por defeito, de um determinado objecto, sentimento ou ideia, de forma a provocar no indivíduo estranheza para além da realidade credível.

Este recurso expressivo encontra-se abundantemente representado tanto na linguagem corrente, através da utilização de determinados prefixos como super- , ultra-, do abuso de superlativos e do uso continuado de determinadas expressões coloquiais como “estar morto de sede”/ “chorar rios de lágrimas”, entre muitas outras, como na linguagem literária, destacando-se, neste caso, na retórica, onde a hipérbole tem como função despertar no público afectos partidários, e na poesia, género no qual pretende a criação afectiva de imagens que ultrapassem a realidade conhecida.

De acordo com o crítico Heinrich Lausberg, existem dois tipos diferentes de hipérbole: a hipérbole pura que consiste na “(…) continuação dos sinónimos partidariamente amplificantes, continuação que ultrapassa os limites da credibilidade” e a “hipérbole combinada com outros tropos” (Elementos de Retórica Literária, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1993, p.159). Neste último caso, esta figura surge frequentemente associada à metáfora – “Mas eu quizera só poder passar/ os baixos da pobreza em tempos taes,/ para de homens formigas gracejar” (Bernardes Lima, Carta V) – e à ironia, juntamente com a qual pretende exagerar, com intuito provocatório, a crítica do partido contrário – “Tão delicada e mimosa era a sua consciência, que não só a picavam os escrúpulos próprios, senão também os alheios” (Vieira, V, 75). O efeito da hipérbole irónica resulta, frequentemente, num processo de deformação caricatural, produtora do cómico – “(…) Seus olhos rasgados/ De avarentos noto,/ Pois quanto mais ricos/ tanto estão mais rotos (…)” (Jerónimo Baía, Fénix , III).

Apesar do uso da hipérbole se ter generalizado, com maior ou menor incidência, nas diversas épocas literárias conhecidas, a sua utilização foi especialmente prolífica na produção épica, na literatura barroca e na literatura romântica, como o podem exemplificar os seguintes versos: “O Céu tremeu, e Apolo, de torvado,/ Um pouco a luz perdeu, como infiado” (Camões, I, 37); “ Calisto Eloi romperia no parlamento os vesúvios da sua eloquentíssima imagiação” (Camilo Castelo Branco); “Não ha homem tão pigmeo ou tão formiga, que não aspire a ser gigante” (Vieira, Sermões); “ Hoje espero, nariz, de te assoar,/Se para te chegar a mão me dás,/Ainda que impossível se me faz/Chegar a tanto eu como assoar-te,/Porque é chegar às nuvens o chegar-te.” (D. Tomás de Noronha, Fénix, V).

{bibliografia}

Fernandes Agudo: Noções de Estilística (1945); Heinrich Lausberg: Elementos de Retórica Literária (1993); Michel Le Guern: Semântica da Metáfora e da Metonímia (1974); Nilce Sant’Anna Martins: Introdução à Estilística (1989); Pierre Fontanier: Les Figures du discours (1977); Willard R. Espy: The Garden of Eloquence – A Rhetorical Bestiary (1983); Silveira Bueno: Tratado de Semântica Brasileira (1960);