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De proveniência greco-latina, este vocábulo designa as diferentes alterações da estrutura de uma palavra, provocadas pela adição, supressão ou mudança de sons, analisáveis em termos sincrónicos ou diacrónicos. Esta figura da expressão implica uma mudança parcial na forma ao nível morfológico, com repercussões maiores ao nível da totalidade linear do significante, fazendo aparecer uma variante que não é normal, mas admissível no sistema.

Na linguagem literária, a variante e a forma normal constituem «formas sincréticas», dado que «o metaplasmo estabelece uma variante em face de uma forma básica» (Mattoso Câmara Jr., 1999, p. 167).

Estas transformações fonéticas apresentam-se sob diversas categorias possíveis e previstas pelo sistema. Para melhor exemplificarmos cada situação, recorreremos a vocábulos presentes nos poemas de Ângelo de Lima.

A «supressão» de, pelo menos, um fonema da totalidade, é possível através de:

–        aférese, quando a queda do fonema se dá no início da palavra como em «Mergir» (in «Edane!»), no verso «Quando For do Mergir na Sepultura», em vez de emergir ou imergir;  

–        síncope, no interior da palavra como em «oscura» (in «Dizem os sábios que já nada ignoram», «Súplica» e «Fado»), por obscura;  

–        apócope, no final, como em «Adulterin» (in «Cântico Semi-Rami») em vez de adulterina, significando adúltera;

Com, pelo menos, um fonema a mais na variante, a «adjunção» é feita através de:

–        prótese, se o fonema surge no início do vocábulo, como o /?/ em «avergado» (in «Aos Mortos de Coolela»);

–        epêntese, quando o fonema aparece no meio do vocábulo, como em «Azual» (in «Edd’ora Addio…»);

–        paragoge no exemplo «serapida» (in «Ocaso») em vez de Serapis, relativa ao acrescento feito no final da palavra.

Além da redução ou do aumento provocado pela supressão ou adição de sons, o metaplasmo conta ainda com uma terceira categoria que inclui «a substituição de, pelo menos, um elemento, que até agora pertenceu à totalidade, por um elemento, até agora, estranho à totalidade» (Lausberg, 1993, p. 102). São exemplos da immutatio:

–        «Exubero» (in «Thora…»), em vez de exúbere;

–        «Cramem-me» (in «Vita!…»), em vez de chamem-me;

–        «Tacida» (in «Qual?…»), por tecida.

Dado que desencadeiam múltiplas possibilidades associativas, estes termos disformes, além de fazerem suspeitar tendências simbólicas, «testemunham-nos o modo como pode o significado resvalar para um significante, sem que nele todavia se esgote» (Guimarães, 1991, p. 21), contribuindo, deste modo, para a «anamorfose textual», na expressão de Calle-Gruber, na medida em que se trata de uma «deformação trabalhada para reactivar a forma, o corpo textual» (Calle-Gruber, 1980, p. 252).

Os cortes silábicos e as alterações gráficas resultantes de processos metaplasmáticos mais não fazem do que pôr «em evidência o lado palpável dos signos» (Jakobson, 1974, p. 218), aprofundando a dicotomia existente entre signos e objectos.

 

 {bibliografia}

Calle-Gruber, M. (1980). Anamorphoses Textuelles. Poétique, 42. Paris: Seuil.

Câmara Jr., J. M. (1999). Dicionário de Lingüística e Gramática. Petrópolis: Editora Vozes.

Jakobson, R. (1974). Linguistique et Poétique. In Essais de Linguistique Générale/I. Paris: Minuit.

Lausberg, H. (1993). Elementos de Retórica Literária. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

Lima, A. (1991). Poesias Completas (organização, prefácio e notas de Fernando Guimarães). 2ª ed. Lisboa: Assírio & Alvim.

Souto e Melo, I. (2003). Intersecções e Metamorfoses. In O Anfigurismo na Poesia de Ângelo de Lima (pp. 65-91). Dissertação de Mestrado em Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto.