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Acerca da divisão da língua, problema importantíssimo em estudos de Linguística Histórica e História da Língua, a verdade é que nem sempre tem havido unanimidade na consideração dos diferentes períodos linguísticos do português. Muitos dos filólogos que, no início do século XX, procederam ao estabelecimento dos períodos da história da língua portuguesa, nem sempre, ou quase nunca, adotaram critérios estritamente linguísticos. Contribuíam para as suas propostas de periodização linguística critérios que mais se confundiam com os períodos da divisão da própria Literatura ou da própria História. Só mais tarde se imprime à periodização linguística um outro rigor, em que são analisados fenómenos singulares na tentativa de estabelecer os termos a quo e ad quem em que cada período do português se define. Será importante, todavia, realçar o contributo, ainda que um pouco assistemático, dos gramáticos, ortógrafos e lexicógrafos dos séculos XVII, XVIII e XIX no que respeita à divisão dos períodos linguísticos do português. Lembramos o esforço que foi empreendido, neste âmbito, até ao momento, visível, nomeadamente, nas propostas levadas a cabo por Carolina Michaëlis de Vasconcelos – Michaëlis de Vasconcelos (s.d.: 17-22) – em que, segundo as abonações da Filóloga, a história do português apresenta duas fases: a arcaica e a moderna. No período arcaico (que se inicia no reinado de D. Sancho I e que se prolonga até 1500 ou ainda mais alguns anos subsequentes), considera dois períodos – o período trovadoresco (até 1350) e o período da prosa histórica ou nacional. A fase moderna da língua coincidirá com o Renascimento e os decorrentes movimentos humanistas. Importante, igualmente, é a proposta de José Leite de Vasconcelos – Cf. Leite de Vasconcelos (1966: 14-19) -, sendo que, à semelhança de Carolina Michaëlis de Vasconcelos, propõe uma divisão bietápica da história da língua: fase arcaica e fase moderna do português. Evanildo Bechara – Bechara (1991: 68-76) – considera quatro fases na divisão do português: fase arcaica (do século XIII ao final do século XIV), fase arcaica média (do século XV à primeira metade do século XVI), fase moderna (da segunda metade do século XVI ao final do século XVII) e fase hodierna (do século XVIII ao século XX).Vejam-se, ainda, propostas mais recentes, nomeadamente as de Ivo Castro – Cf. Castro (1991: 243 e ss.) -, Clarinda de Azevedo Maia – Cf. Maia (1995: pp. 22-309) -, Rosa Virgínia Mattos e Silva – Mattos e Silva (1991: 15-27) -, entre outros.

No que respeita à periodização, poder-se-á dizer que, de acordo com Leite de Vasconcelos, é costume dividir-se a história da língua portuguesa em dois grandes períodos: o arcaico (desde os primeiros textos, ou seja, desde os começos do séc. XIII, até Camões) e o moderno (do século XVI até hoje). Embora seja verdade que, entre as línguas românicas, o português, ao longo dos séculos, tenha mudado algo mais do que o italiano (a língua novilatina com literatura que maior fidelidade manteve em relação às origens), está, contudo, longe de apresentar uma diacronia parecida com a do francês, que se situa no extremo oposto, por ser o idioma mais inovador desta família, ou seja, o que mais se distanciou do latim.

Pode admitir-se, para a história da língua portuguesa, uma periodização que torne mais adequada a proposta de Leite de Vasconcelos e que coincida, ao mesmo tempo, com a tripartição, geralmente, adoptada para línguas como o castelhano, cuja evolução é semelhante à do português. Teremos assim: o período medieval (da segunda metade do século XII ou inícios do século XIII até meados do século XVI); o período clássico (de meados do século XVI até meados do século XVIII) e o período moderno (da segunda metade do século XVIII até hoje). Esta tripartição periodológica é a que costuma ser também usada na história de línguas como o inglês (Old, Middle, Modern English) e o alemão (Alt-, Mittel-, Neuhochdeutsch), cuja diacronia, aliás, se assemelha mais à do francês do que à das restantes línguas românicas mencionadas

Gärtner (1999) apresenta uma proposta de periodização muito pertinente. Dela faz Noll (2005: 119) a seguinte apreciação: «Quanto à língua portuguesa, a síntese de Gärtner [1999] distingue o período do galego-português (800-1350), dividido entre uma fase maiormente oral e a formação da tradição escrita (1200-1350), o português pré-clássico (1350-1550) e o português moderno (desde 1550). O português moderno se subdivide no português clássico (1550-1750), numa segunda fase transitória (1750-1850) (como a pré-clássica, mas sem denominação da parte de Gärtner) que leva à contemporânea, e no português contemporâneo (desde o séc. XIX). Nesta periodização, os critérios lingüísticos são evidentes. Salientam a reestruturação românica até aproximadamente 800 e as duas fases transitórias que refletem as mudanças fonéticas/fonológicas e morfossintáticas entre o galego-português, o português clássico e o português moderno».

{bibliografia}

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