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Esse rótulo ambíguo, “poesia marginal” (que pode ter n implicações), aplica-se aqui a um fenómeno específico que surge na poesia brasileira, em fins dos anos 60, nos rastos do boom da Música Brasilera (MPB), representada por Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil… Ou mais especificamente, poesia que se manifesta como um múltiplos desdobramentos do Tropicalismo, lançado por Caetano Veloso com “tropicália”, no pós-64, como um repto à Ditadura Militar que se instalara no Brasil.

É evidente que sempre existiu a marginalização do autor “novo” e anónimo, face à crítica e ao mercado editorial. desde os primórdios, as histórias literárias estão cheias de exemplos de grandes poetas ou grandes artistas que, em seu tempo, foram “marginais”, e hoje gozam de consagração mundial. Mas neste caso específico, “poe-marginal” brasileira resultou de um determinado comportamento anti-sistema e que nasceu no clima tropicalista, “salada-de-frutas” ou “geleia geral” que envolveu, ao mesmo tempo, o público “rockeiro” e o intelectualizado.

Ampliou-se o interesse da faixa mais jovem pela poesia (ou por tudo que pudesse ser poesia) justamente (e não, por acaso) no momento em que foi baixado o AI-5 (Acto Institucional n.º 5) endurecendo a censura à palavra escrita, falada ou cantanda. Surge a “geração mimeógrafo”, a que fora do circuito editorial, imprime seus poemas em toscos folhetos mimeografados e os vende nos bares, portas de teatro, praças públicas ou nos meios boémios noctunos.

No confuso ambiente de contracultura que se impõe principalmente nos grandes centros urbanos (São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba …), a poesia marginal identifica-se não só como produção “fora do sistema” (como várias outras manifestações da literatura e da arte), mas por sua intencionalidade de contestação pelo “desbunde”, pelo palavrão, pela apologia do lado sórdido da vida … Daí ser chamada também de “lixeratura”, a literatura do lixo, da sujeira.

Termo emprestado das ciências sociais (para definir o indivíduo que, entre duas culturas, vive em conflito ou à margem de ambas), Passou à área da poesia e da arte mais como padrão de comportamento ético-social e não de grau de conhecimento. da avalanche de “poetas marginais” que surgiram nos anos 70/80 (alguns dos quais acabaram realizando obra de autêntica poesia, como Ulisses Tavares, Chacal, Ana Cristina César, Nicolas Behr …), destaca-se a participação feminista: a mulher expressando uma linguagem-do-corpo agressiva, descrevendo as relações eróticas de maneira vulgar e obscena, buscando o avesso da chamada “lírica feminina”. Uma das mais activas dinamizadoras dessa produção feminista foi Leila Miccolis, responsável pela organização de varias antologias, exposições de poesia, espéctaculos públicos, etc.

{bibliografia}

Ainda não existe uma bibliografia específica sobre poesia marginal, pelo próprio facto de ela se fazer “Fora do sistema, i. é, a maior parte de sua produção poética circula paralelamente, sem chegar às livraraias e bibliotecas, divulgada em períodos culturais e literários, antologias ou analisada em teses universitárias. Nos anos 80, foi criado o Centro da Cultura Alternativa, no Rio de Janeiro, mantido pela Fundação Rio e pela Oficina Literária Afrânio Coutinho, onde há todo um trabalho de levantamento sendo feito. Actualmente, nas livraraias podem ser encontrados os títulos: Helois Buarque Holanda (org.), 26 Poetas Hoje, Rio de Janeiro, 1976; id., Impressões de Viagem (tese sobre a poesia dos anos 60/70 no Brasil). São Paulo, 1980; Glauco Mattoso, O que é poesia marginal, São Paulo, nº. 81 Jornal Dubrasil, São Paulo, 1981; Leila Miccolis (org.), Mulheres da Vida, São Paulo, 1978; id., Silêncio relativo, 1978; id., Respeitável público, 1980; id., Impróprio para Menores 18 Amores, 1977; Carlos Alberto Messeder Pereira, Retrato de Época: poesia marginal – anos 70, Rio de Janeiro, 1981; Domingos Pellegrini, O Marginal e outros poemas, s/d. ; Braulio Tavares, As baladas de Trupisupe, s/d.; Jornais Alternativos (anos 70/80) Totem, Ovelha Negra, Ora Pombas! Lampião e outros; Revista Escrita, São Paulo, 1975-1978; Trindada Socorro (org.), Filhas da mãe, 1978.