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[Do prov. sirventès ou do fr. arcaico sirventois] Género medieval de carácter satírico, que surge no séc XII, na Provença. Trata-se de uma composição trovadoresca de género satírico onde se reflecte sobre aspectos gerais ou particulares da vida moral, social, política e literária. O sirventês apresenta-se sob a forma da canção provençal e pode cantar-se com a melodia de uma já existente, o que, segundo Martín de Riquer, se deve essencialmente ao facto do sirventês, especialmente o de carácter político ou pessoal, se tratar de uma composição que exige actualidade e que pode perder eficácia se não aparecer imediatamente após o acontecimento sobre o qual se refere, utilizando por isso uma melodia e uma métrica já existentes, uma vez que uma composição original levaria bastante mais tempo a ser elaborada. Além disso, a sua divulgação também se encontra mais facilitada deste modo.

Para o termo sirventês, são habitualmente propostas duas etimologias diferentes. A primeira refere que o termo se deve ao facto desta composição se servir da estrutura formal e da melodia de uma canção já existente e a segunda propõe que se trata de um poema composto por ou para alguém que serve um senhor.

Devido ao seu conteúdo, estas composições de carácter satírico são normalmente agrupadas em quatro grandes divisões.

O sirventês moral reflecte sobre a decadência da sociedade da época, sendo frequentes os ataques à corrupção, assim como a censura a episódios de maus costumes e as queixas sobre a degradação das virtudes cavalheirescas. Marcabrú, trovador da Gasconha no séc. XII, escreveu e divulgou abundantemente este tipo de sirventês.

O sirventês político, como é sugerido pelo nome, é uma reflexão sobre os acontecimentos políticos da época, tratando temas como a luta dos reis ingleses contra os senhores feudais franceses, as cruzadas do Oriente e outras campanhas militares e religiosas. Muitos senhores feudais rodeavam-se de trovadores que difundiam a sua política, defendiam a sua actuação e atacavam inimigos. Bertran de Born, trovador francês, é um dos grandes representantes deste sirventês político, destacando-se as suas composições sobre as lutas entre os Plantagenet, o rei de França e o de Aragão. Na literatura galaico-portuguesa, estes temas políticos, abordados nas canções de escarnho e maldizer, assumem um carácter mais pessoal e desinteressante porque, estando o poder única e exclusivamente nas mãos do rei, não eram possíveis críticas de carácter político.

O sirventês pessoal é constituído por ataques à vida profissional ou particular de um indivíduo. Geralmente, os visados eram outros trovadores que eram ridicularizados pelos seus vícios. Guillem de Berguedà, trovador catalão do séc. XII, é um dos autores e divulgadores do sirventês pessoal.

O sirventês literário tece frequentemente algumas considerações de ordem estilística, mas geralmente é composto por críticas pouco simpáticas a outros trovadores que são acusados de plágio, de desrespeito às regras da poesia cortesã, de falta de perícia e de inaptidão cultural, acabando assim por confundir-se com o sirventês de carácter pessoal.

Deve ser ainda referida a existência de certas composições que foram agrupadas sob a designação de sirventês-canção. Trata-se de um poema cujo tema reúne características próprias do sirventês e da canção. É o caso de uma composição de Falquet de Romans cujas três primeiras estrofes são sobre uma dama e as seguintes sobre assuntos políticos.

{bibliografia}

BUESCU, Maria Leonor Carvalhão: Literatura Portuguesa Medieval, Universidade Aberta, 1990;LAPA, M. Rodrigues: Lições de Literatura Portuguesa – Época Medieval, Coimbra ed.,1ª ed. ,1929, 10ª ed., 1981; LE GENTIL, Pierre: La poésie lyrique espagnole et portugaise à la fin du Moyen Âge- vol I, 1ª ed. 1949, (1981); RIQUER, Martín de: Los trovadores-Historia literaria y textos – Tomo I , 2ª ed., Coléccion Letras e Ideas, Editorial Ariel, 1989 (1ªed., 1975).; ROUBAUD, Jacques: Les Troubadours, Éditions Seghers, (1971); TAVANI, Giuseppe: A poesia lírica galego-portuguesa, Comunicação, 1990; TAVANI, Giuseppe: “Sátira literária”, “Sátira moral” e “Sátira política” in Dicionário da literatura medieval galega e portuguesa, Organização de Giulia Lanciani e Giuseppe Tavani, Caminho, 1993; ZUMTHOR, Paul: Histoire littéraire de la France Médiévale, Slatkine, 1981.