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Termo que designa, não um movimento ou escola teatral limitada espácio – temporalmente ou com um manifesto específico e claro, mas antes uma atitude de crítica e ruptura não só face à ordem teatral pré- estabelecida, normalmente centrada numa lógica burguesa e comercial, de um teatro com repertório fixo, clássico e de fácil compreensão para as massas; bem como à ordem social e política que servia de base a tal teatro. Assim, Teatro experimental pode ser também definido como teatro de vanguarda, teatro laboratório, teatro de investigação ou teatro moderno.

Podemos dizer que, a partir do fim do séc. XIX, passando pelos movimentos de vanguarda dos anos vinte do séc. XX , pelos inovadores franceses como Artaud e Copeau, pelos realistas críticos como Piscator e Brecht, e por uma constelação quase interminável de grupos experimentais que surgem no contexto do pós-guerra, e sobretudo a partir dos anos 60 e 70 do mesmo séc., o Teatro experimental instalou-se no panorama teatral mundial, dando voz a uma necessidade que serve uma realidade contemporânea pós- moderna, e como tal auto- reflexiva, crítica, ecléctica e alternativa.

Tentando encontrar alguns pontos de contacto entre todos estes movimentos, podemos considerar três grandes atitudes distintas, porém muitas vezes interligadas, que ajudam a explicar a génese do Teatro experimental: Uma atitude técnica e estética inovadoras, uma atitude política, social e moral, e uma atitude auto- reflexiva. Tendo presentes as inovações (na iluminação, nos espaços arquitectónicos, e nos diversos materiais a utilizar), que são uma constante ao longo de todo o séc. XX e agora XXI, o teatro começa a experimentar as potencialidades que estas inovações oferecem. Para além do trabalho do texto, emerge a figura do encenador, do director de actores, dos técnicos, passado assim o espaço teatral a explorar novas linguagens e a ser também um espaço a que eu chamaria neo- barroco, já que tenta voltar a impressionar os sentidos do espectador através do artifício. Palcos móveis, cadeiras que se podem remover, número infinito de luzes e som muitas vezes ofuscam a verdadeira essência do texto, já que, se estas inovações não tiverem um propósito, não passam de artifícios vazios. É por esta razão que Copeau crítica todos aqueles inovadores, que apenas experimentaram numa perspectiva técnica mas desprovida de sentido dramático, sem objectivos concretos para além da impressão imediata. Estes autores ficaram, segundo Copeau, a meio do que devia ter sido o seu percurso teatral.

Outra das faces do Teatro experimental é sua função política, social e moral. Enquanto teatro de reacção à ordem instituída, o Teatro experimental ganha muitas vezes contornos de teatro de luta, modificando não só as temáticas a apresentar, numa atitude de crítica social, bem como as estratégias dramáticas a utilizar, pois as antigas serviam também a sociedade que estavam a criticar. Tenta- se, assim, que o teatro não só desperte para novas temáticas, como também que as suas linguagens mudem, para melhor reflectirem as suas mensagens muitas vezes de ruptura face ao poder em vigor.

Exemplos bastante ilustrativos do acima referido são as propostas teatrais de Piscator (Teatro proletário) bem como as de Brecht ( Teatro épico). Ambas tentam chamar à atenção do público para uma classe oprimida, marginalizada política e socialmente, e para a necessidade imperiosa de uma luta, de uma radical mudança no status quo. As técnicas teatrais rompem também com as convenções estabelecidas. Os heróis trágicos clássicos, de estatuto social elevado, são substituídos por heróis que representam grupos sociais oprimidos, muitas vezes sem nome, pois o indivíduo dava lugar a uma luta colectiva. Este teatro de “engagement”, que servia a emergência do comunismo, dispunha de novas técnicas e uso de novos materiais, que servissem e melhor espelhassem a mensagem a transmitir, como sendo o uso de audio- visuais e linguagens por vezes jornalísticas.

Mais recentemente surgem propostas teatrais que dão voz aos afro- americanos (Black Theatre movement), aos gays e lésbicas (Teatro gay, a partir dos anos 70), às mulheres (Teatro feminista), enfim, a grupos marginais, que procuram reclamar a sua identidade social e política muitas vezes oprimida pela ordem vigente, adquirindo o Teatro experimental um estatuto de teatro alternativo.

Por fim temos um caris auto- reflexivo também presente no Teatro experimental. Tal como o nome indica, experimental remete-nos para experiência e tentativa, e, desta forma, este tipo de teatro dá grande importância ao próprio processo teatral, uma peça é escrita, re- escrita, re- interpretada, discutida, modificada, dialecticamente trabalhada entre encenador, actores e público. Na verdade, uma peça, para muitos grupos teatrais nunca está terminada, chegando ao ponto de ser apenas um exercício de especulação plurisignificativa, que pode até chegar a subvalorizar o papel do espectador, fazendo do teatro apenas ensaios e investigação. Por outro lado, os próprios textos muitas vezes abordam problemáticas teatrais, procurando o lugar e essência do teatro na realidade e da realidade no teatro. Assim, entramos já no domínio do metateatro, ou seja do teatro que tem como objecto de criação o próprio processo teatral, desconstruindo e desmascarando o seu universo fictício e artificial. Teatro mistura-se assim com realidade a desafia a própria definição de teatro. Exemplo desta atitude são as inúmeras obras do Teatro do Absurdo, muitas vezes exercícios especulativos sobre a impossibilidade da linguagem abarcar a (ir)realidade, criando e reflectindo sobre novas opções de universos fictícios. Como nos diz Patrícia Pávis “todo es teatro y ya nada lo es”.

Embora, tal como vimos anteriormente, alguns grupos/movimentos teatrais se centrem mais numa ou outra atitude, muitos são também aqueles, sobretudo contemporâneos, que nasceram e têm como génese a tentativa de síntese entre as várias perspectivas anteriores. Tomemos como exemplo dois excertos de “manifestos” ou textos- base de um grupo de Teatro experimental chileno (Teatro Chileno Universitário) e um brasileiro (TEP- UNISANTA, em Santa Cecília):

CHILE’S UNIVERSITY THEATRE

“(…)The impetus for this experimental movement was twofold. First there was a desire to present the public with socially relevant drama as opposed to the offerings of the commercial theatre. Second, there was a wish to promote the growth of a contemporary national drama. […]

In order to present polished performances, the establishment of a school to train actors, directors, and technical personal quickly followed. The group toured Chile and founded theatres in Antofagosta, Rancagua, San Fernando, Chillán, and Concepción. (…)”

TEP (UNISANTA)

“Fundada no final dos anos 60, direcionando-se então ao questionamento dos poderes investidos nas ditaduras que qualificavam este período, e em defesa das liberdades individuais.[…]

O TEP possui um comportamento com causas específicas, não só de diversão, o questionamento é o principal ponto, procurando abordar o homem quanto à conduta, relações sociais e sua própria existência. Para Gilson, os grupos Universitários são privilegiados, pois possuem um local para ensaiarem, “a Universidade cede o local dos ensaios, as condições de desenvolvimento dos projetos e equipamentos.(…)”

Como é bastante claro, estes dois exemplos têm como base uma atitude político-social (surgindo o segundo como reacção a um poder ditatorial), de questionamento e investigação ( auto- reflexivos) permanentes, mas não descurando as inovações técnicas ao serviço da dramaturgia.

Dado o sucesso que muitos destes grupos teatrais tiveram junto do público, que cada vez mais se identifica com as propostas dadas, o Teatro experimental foi passando em alguns casos do seu carácter declaradamente marginal e crítico, para uma forma mais institucionalizada de teatro, a qual passará a obedecer a uma lógica comercial e de lucro, tentando abarcar cada vez mais público, perdendo assim parte da sua essência e objectivos iniciais.

Contudo, podemos afirmar que o Teatro experimental aparecerá sempre como uma voz de liberdade contra qualquer ordem estabelecida ou um qualquer preconceito. Este teatro, que dá voz ao outro, que explora os domínios inter- e multiculturais, que baseia a sua prática na inovação e reciclagem constantes, que abarca e recria técnicas antigas e modernas como sendo o filme, a televisão, a dança, a pintura, o circo, a literatura, a música, a informática, a expressão corporal, nasce e renasce com potencialidades ilimitadas.

{bibliografia}

Christopher Innes, “Theatre after two world wars”, John Russel Brown, “Theatre since 1970”, Martin Esslin, “Modern Theatre 1890-1920” in John Russel Brown, (dir.), The Oxford illustrated History of Theatre, (1995).

Patrice Pavis, Diccionario del teatro. Dramaturgia, estética, semiologia, (1998).

http://hemi.ps.tsoa.nyu.edu/archive/bib/donnellygautier/teatro.shtml

http://www.uol.com.br/teatroficina/oficina/40anos_1.htm

http://www.companhiadolatao.com.br/

http://w3.unisanta.br/comunidade/tep/historico.asp

http://www.geocities.com/tepwh/twh/historicoa.htm