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Figura retórica de pensamento que consiste em explicar o significado de uma palavra, a partir da sua raiz etimológica ou do contexto em que ocorre. Definir um conceito é, em termos filosóficos e literários, algo mais complexo que pode exigir ir além de uma breve explicação. Encontramos definições breves e sucintas nos dicionários e nos glossários, sobretudo; encontramos definições especulativas nos tratados de filosofia e nas reflexões teóricas da literatura. Também se deve acrescentar que a definição é a base de trabalho de qualquer ciência que nos queira propor uma teoria ou que pretenda defender um conceito original.

O termo definição vem do latim definitio ou “determinação de limites”, que correspondia ao grego horismos, de horizo, isto é, “delimitar”, “explicar”. Na filosofia antiga, a definição é uma operação intelectual apurada que nos permitia aceder à compreensão correcta e exacta da essência de um ser e do seu lugar ontológico em relação ao universo de todos os seres. Aristóteles defendeu que uma definição é perfeita quando inclui duas características: o “género próximo” e a “diferença específica”. Por exemplo, o homem define-se pelo facto de pertencer ao reino animal (género próximo) e pelo facto de ser racional (diferença específica). O enunciado que propusemos inicialmente para este conceito pode ser lido assim: definir uma palavra é explicar o significado dessa palavra (género próximo), a partir da sua raiz etimológica ou do contexto em que ocorre (diferença específica). Existe um segundo tipo de definição que Aristóteles considera de menor valor: aquela que define apenas pelas partes, como no caso em que definimos um instrumento musical particular pelas características que possui, ao ponto de produzir uma sonoridade diferente de todos os outros instrumentos. Neste caso, o termo definido não tolera nem a especulação nem a argumentação, daí o seu reduzido valor filosófico.

Os escolásticos vão considerar dois outros tipos de definição: nominal, se dependente da explicação etimológica; real, se resulta da explicação dos elementos essenciais da realidade ou da coisa designada pelo nome definido. Em texto dedicado aos etimológicos, Fernando Pessoa demonstrou como uma definição não pode estar dependente da mera explicação original e histórica de um conceito ou de uma dada palavra, ou como na filosofia escolástica, não pode ser unicamente nominal nem unicamente real. Entrando no domínio do que chamámos definição especulativa, no início do artigo, Pessoa observa com acerto que “Compreender uma coisa é fazer dela uma ideia que seja susceptível de definição positiva e completa. Por definição positiva entendo o poder-se dizer duma coisa o que ela é, e não somente o que ela não é, como acontece por exemplo, com o infinito. Por definição completa entendo uma que inclui todos os atributos da coisa definida. Se um teísta, definindo Deus, dissesse que ele «é a causa do mundo», daria uma definição incompleta, pois o ser causa é apenas um atributo; definindo Deus apenas como uma causa não daria o teísta sequer uma ideia negativa do que considera a sua essência.” (“Da impossibilidade de uma ciência do lexicon” (1906), in Textos Filosóficos, vol. I., Ática, 1968, imp. 1993). Uma boa definição exige, pois, que nunca se perca de vista a natureza daquilo que se define, quer a possibilidade de ser quer a possibilidade de não ser. Também convém que a definição seja mais clara do que a coisa definida (o termo de Deus, por exemplo, ganha mais clareza naquilo que podemos dizer que é e não é do que numa simples descrição etimológica — é essa a diferença entre afirmar que “Deus é pura identidade” e afirmar que a palavra “Deus” se explica a partir da Vulgata com o famoso tetragrama YHVH, ou Iahweh. A definição do termo “Deus” tornar-se-ia especulativa, mesmo neste limiar etimológico, se lembrássemos que tal nome nunca era pronunciado pelos judeus desde os tempos mais remotos, por se tratar do próprio nome de Deus, tão sagrado e significante que nenhum mortal o podia pronunciar sequer, contando, no entanto, com um substituto – Adonai (“meu Senhor”); a combinação das consoantes de YHVH e as vogais de Adonai vieram a dar o híbrido Jeová – para compensar a inacessibilidade do nome de Deus. Se daí eu concluísse que Deus é a pura identidade, EU SOU QUEM SOU, ou na minha fórmula, Deus sou eu mais Eu, estaria a contribuir para uma definição especulativa que nos diz mais sobre a coisa definida do que a sua simples descrição etimológica. O facto de eu considerar — na minha subjectividade intelectual, que é comum a qualquer indivíduo — que esta definição é “positiva” e “completa”, para usar os atributos de Pessoa, pode contribuir para apenas iniciar um problema, que deve ser a principal qualidade de uma definição especulativa-argumentativa.