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Literatura Juvenil é um tipo específico de expressão literária, constituído por obras de ficção, escritas geralmente por adultos e destinadas a um público juvenil, por isso, baseadas em contextos determinados, com conteúdos temáticos sistematizáveis e normas formais bem definidas.

Numa perspectiva global, aliás, o que define a Literatura Juvenil é a presença permanente de um diálogo entre o autor e o leitor, encarados numa relação de forças oposta àquela que é aceite na literatura para adultos. Como diz Gunter Kress (1985) “observa-se uma inversão da situação usual em que há um poderoso autor/escritor e produtor de sentido, dominando um leitor/consumidor de sentido, consideravelmente menos poderoso”. Assim o que se nos depara é um autor empenhado, que ausculta o seu jovem leitor e se orienta pelos seus interesses e os seus gostos.

Esta alteração de relacionamento do escritor com o seu público não constitui uma limitação deste modo literário, antes, é uma determinante fundamental, consequência natural do facto que, pelas suas características afectivas, este jovem leitor ainda liga o prazer estético ao lado lúdico da vida, além de rejeitar certos parâmetros elitistas que lhe asseguram que o escritor é um ser especial que paira acima do vulgo. Para qualquer jovem, o autor é sobretudo um contador de histórias emocionantes, que consegue transferir para palavras, interpretações sensatas da realidade que nos cerca.

Em termos etários, podemos considerar que a Literatura Juvenil se dirige a um público de idade superior aos doze anos, pois, cognitivamente, dá-se por essa altura o acesso à (pré-)adolescência: os jovens entram, então, numa fase de crescimento em que iniciam a interpretação do mundo, procedendo a um alargamento cognitivo do ‘eu’ e, muitas vezes, a um distanciamento do seu universo imediato que passa a ser encarado dum modo crítico. Com efeito, com a aproximação da adolescência os jovens passam a interessar-se por uma exploração de factos e acontecimentos do mundo em geral e racionalizam, criticam e seleccionam as experiências vividas. No que diz respeito à Literatura, aprendem a encarar o lido como uma forma de aprendizagem, preparando-se assim para interiorizar um dos mais importantes contributos da leitura para a vida de cada um.

Como consequência desta nova fase cognitiva, os jovens procuram na Literatura temáticas actualizadas que lhes transmitam respostas para os problemas que os perturbam e, porque etariamente é uma idade de inquietação e sobressalto, este jovem público leitor prefere livros dinâmicos. constituídos por muitos acontecimentos e vividos por personagens com quem se possam identificar. Daí, revelarem um marcado gosto pelo romance de aventuras e sobretudo pelo romance em série, de acordo com o modelo iniciado por Enid Blyton com “Os Cinco”. Em Portugal, as colecções que dominam o mercado do livro juvenil são “Uma Aventura…” de Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada, “O Clube das Chaves” de M. Teresa Gonzalez e M. Rosário Pedreira e o “Triângulo Jota” de Álvaro Magalhães.

Em termos de estrutura narrativa, este modelo ficcional apresenta um grupo de personagens sempre idênticas, definidas pelo nome de baptismo – ou, algumas vezes, por alcunhas afectivas – e por uma descrição física e psicológica tipificada. Esta esquematização permite uma mais fácil adesão do público, já que traços gerais enquadram todas as modalidades de jovens. Mais importante ainda, é o enquadramento social destas personagens que, como todos os jovens que lêem estes livros, vivem em cidades ou aldeias identificáveis, integram-se em famílias comuns, têm amigos com quem jogam, trocam confidências, brigam e partilham o estudo e as fantasias; gostam de andar de bicicleta, de andar de patins, gostam de ver televisão e ir ao cinema, gostam de ler de vez em quando!…

Na escola, estas personagens falam-nos dos estudos e da hora de recreio, distinguem os professores que admiram, criticam o sistema, rejeitam o que está velho e ultrapassado. No seu relacionamento com a família vivem intensamente os problemas – mortes de pessoas que amam, divórcio dos pais, difculdades económicas familiares -, e debatem-se com os problemas do dia-a-dia: a mãe que é chata, o pai que não os compreende, o irmão que é ‘queixinhas’…

Através de muitas contradições e sobressaltos estes adolescentes/ ficção vão definindo o seu lugar no mundo, decidindo o que querem e como o conseguir, marcando posições, de preferência, sem chocar demasiado o grupo. Todo este tipo de romance em série define um jovem irreverente, mas não revoltado, em que a rebelião se concretiza num mero argumentar. Nunca há dúvidas sobre o amor da família, não há inadaptações excessivas dentro do sistema escolar: em suma, o que se levanta diante de nós, é o (pré-) adolescente/médio que todos conhecemos e com quem convivemos diariamente.

Quanto ao enredo, as histórias desenvolvem-se através da sucessão de eventos apresentados num ritmo ascendente, utilizando o ‘suspense’ como elemento intensificador, e tendo sempre uma conclusão feliz. Narrativas claramente fechadas, usam a descrição em trechos muitos curtos e apenas em momentos de absoluta necessidade. Ao contrário, o diálogo interrompe cpm frequência a narração e nunca é contraposto ao monólogo, que permanece como recurso estilístico praticamente inexistente.

Também faz parte do modelo da Literatura Juvenil a criação duma linguagem literária adequada. Esta matriz linguística aproxima-se o mais possível da linguagem corrente, sendo comum a ilusão da oralidade. Além disso, simplifica os diálogos, reduzindo as incómodas frases de ligação e suprimindo as aspas como sinais ortográficos indicadores de começo de fala. Esta linguagem literária, morfologicamente, privilegia os substantivos concretos, os verbos estativos, de movimento e os afectivos; usa. geralmente, tempos verbais simples, sobretudo do presente e do passado; no que diz respeito ao tipo de frase, prefere a “frase narrativa” à Labov, em que a oração principal é modificada, sobretudo, por coordenação aditiva ou adversativa, e por subordinação temporal, causal ou relativa.

Além dos escritores supracitados e que estão envolvidos no prosseguimento das séries respectivas, muitos outros autores têm escrito para os jovens dentro da Literatura Portuguesa Contemporânea, enquadrando-se igualmente nas características do modelo literário que atrás definimos. Apenas, como exemplo, citaremos alguns nomes que, pela extensão ou pela originalidade da obra contituem já um marco fundamental. A nossa primeira referência vai para Alice Vieira, escritora de temática muito diversificada, mas que, em geral, se preocupa sobretudo com as atitudes levianas dos adultos e no modo como essas posições se reflectem em sofrimento no coração dos jovens: solidão, confusão de sentimentos, ciúmes e cólera contida, desamor atravessam os seus livros, mostrando como o adulto tantas vezes trai a confiança dos jovens que diz amar. Outro ficcionista, António Mota, tem como tema maior a adaptação dos jovens de meio rural à vida citadina e o seu livro “Pedro Alecrim” é já um clássico para estas idades. Em termos de originalidade, um outro narrador vem chamando a atenção: falamos de António Torrado, e do seu constante recurso ao humor e à fantasia. Aliás, esta muitas vezes se tinge de absurdo, como quando a personagem da narrativa é uma laranja, que perfuma todo o compartimento do comboio!…

Dentro do modelo pedagógico da Literatura Juvenil actual, uma escritora se tem destacado: é a médica Graça Gonçalves que, após um período de desenvolvimento de temáticas à volta dos factos naturais da vida, como o nascimento, encaminhou a sua obra para temas de prevenção de doenças, como sucede em “Plim, e a Sida é Assim”.

Além deste conjunto de escritores que escreve especificamente para crianças e jovens, outros escritores da Literatura Portuguesa são lidos pelos nossos adolescentes, muitas vezes por gosto adquirido através do sistema escolar. Os que são mais divulgados são Soeiro Pereira Gomes, Miguel Torga, Gomes Ferreira, Sofia M. Breyner, e António Gedeão.

Dentro desta apresentação muito sucinta de autores ligados à Literatura Juvenil cabe-nos, por fim, referir as traduções de autores estrangeiros, já que alguns desses criadores têm grande aceitação entre o nosso público jovem: assim sucede com os livros de E. Blyton que narram as aventuras dos ‘cinco’ ou dos ‘sete’, ou sobretudo com as obras de Salgari que nos apresentam o valoroso Sandokan, ou mesmo os textos de Burroughs com as complicadas aventuras de Tarzan, ou os livros de Júlio Verne. A popularidade destas traduções parece surgir como uma resposta à ausência, na Literatura Juvenil Portuguesa dum grande herói, com quem o nosso jovem público se possa identificar.

{bibliografia}

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