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Palavra que aparece, pela primeira vez, no séc. XVII, como título do livro de J.C. Dannhauer “Hermenêutica sacra sive methodus exponendarum sacrarum litterarum”. No entanto, as suas formas preliminares, o verbo hermeneuein e os seus derivados os substantivos hermeneús e hermeneia,cobrem na língua grega um âmbito muito extenso. A expressão “hermenêutica”, diz-nos Heidegger, deriva do verbo grego hermeneuein.Este refere-se, por sua vez, ao substantivo hermeneus, que poderá ser aproximado sem o rigor da ciência, do nome do deus Hermes . Hermes era o mensageiro dos Deuses; anunciava o destino. Hermeneuein era a revelação que levava ao conhecimento, por parte daquele que estivesse em condições de ouvir uma mensagem.Esta revelação tornava-se, em seguida, exegese de aquilo que foi dito pelos poetas – que, segundo as palavras de Sócrates no diálogo Ion de Platão, são os mensageiros dos Deuses. De acordo ainda com G.Ebeling, representante da Hermenêutica evangélica contemporânea, a origem etimológica de hermeneuo e dos seus derivados é duvidosa, mas enraíza no significado de falar, dizer. O vocábulo tem três orientações de sentido: afirmar(exprimir), interpretar (explicitar) e traduzir(servir de intérprete). Uma linha comum aparece aqui: a ideia de que algo deve ser tornado inteligível, de que devemos conseguir que seja entendido. A própria ideia de que a linguagem é já hermeneia originária do real ou “ interpretatio” nasce no mundo grego com a obra “Organon” de Aristóteles, na qual se discutem, numa das partes – ”Peri Hermeneias”( De Interpretatione) – os diferentes modos do falar.

A palavra hermenêutica cobre, pois, já desde o mundo grego vários níveis de reflexão. Designa, fundamentalmente uma technê (e não uma ciência), a arte de interpretar e apropriar os grandes textos – que fundavam, pela sua dimensão simbólica e normativa uma determinada comunidade humana – ou ainda a arte de compreender o sentido latente e obscuro de mensagens que reclamam ser entendidas. Era, aliás, o lugar-comum da formação do homem culto greco-romano e medieval. Representava uma forma da compreensão ou experiência humana de sentido que tinha fundamentalmente a ver com a praxis da orientação e com a capacidade de escolha num mundo comunitariamente marcado por um conjunto de valores, de costumes,de usos, de crenças e de tradições.

Interpretavam-se, assim os textos, clássico, bíblico e jurídico, por motivos de orientação num mundo marcado pela linguagem narrativa e vivido em comunidade.A temática hermenêutica adquire, aliás, relevância, neste seu primeiro período não teorético nem filosófico, em momentos de crise da tradição, nomeadamente aquando: da campanha platónica contra os deuses dos mitos e dos poetas a favor do deus divino dos filósofos ; da reconciliação da herança de Homero com o mundo helenístico; da polémica entre a “ allegorese” helenística e a interpretação histórica, própria do âmbito judaico-cristão; do conflito entre as escolas de Antioquia e Alexandria quanto à interpretação literal ou simbólico- alegórica; da necessidade que a mundividência latina teve de apropiar e traduzir o que era importante na cultura grega; dos empenhos feitos pelo direito romano para transmitir ao Ocidente a poesia e a filosofia gregas tal como a palavra da Sagrada Escritura; do impulso da Reforma para interpretar a Bíblia por si mesma.

Até ao séc. XIX, a Hermenêutica desenvolveu- se, pois, como disciplina auxiliar das ciências que se orientavam normativamente para os antigos clássicos e para a Bíblia Significou apenas o processo de tornar compreensível pela palavra viva, e não uma forma de ciência ou saber no qual actuassse uma razão conceptual rigorosa. Até aos séculos XVIII e XIX, lembra-nos mesmo Gadamer, a Hermenêutica desenvolvida mais como uma arte do que como uma ciência estava primordialmente ligada às artes práticas, que tornam possível a conduta básica do existir no mundo , como a Gramática, a Rétórica e a Dialéctica.Pertencia ao âmbito da scientia practica. Designava uma capacidade natural do homem, a capacidade para ser e se comprender nas relações plenamente significativas com os outros homens. Era a arte de compreender os outros e de com eles se entender pela palavra. Partilhava com a Rétórica o processo de tornar comprensível pela palavra viva que interliga, co-implica, mas não subsume, fosse esta representada pelo diálogo vivo ou pelos grandes textos e narrações que fundam pela sua transmissão de ideais uma determinada pertença vivida em comunidade.

Momento decisivo desta Hermenêutica não filosófica nem teorética, marcada pelo efeito da palavra na vida humana, nomeadamente da palavra bíblica, foi a Reforma Protestante e sua defesa do primado do texto contra os ataques contrareformistas de Trento. Surge aqui a primeira forma significativa da Hermenêutica não filosòfica. Marca-a não a preocupação metodológica com o texto mas a necessidade de explicitar a normatividade de uma palavra, que deve atingir quem nela crê, levando a uma acção e a uma conversão de vida. A palavra é letra morta,pensava Lutero, se não é experimentada como um incitamento a uma metamorfose ou transformação espiritual. Para este teólogo, fundador do movimento da Reforma, a palavra da Bíblia não pode ser letra morta. Espera uma resposta, isto é, orienta-se para uma apropriação pessoal do crente. É na verdade, no contexto argumentativo da Reforma Protestante – e sua defesa da legibilidade e normatividade do texto bíblico contra o princípio de autoridade da tradição católica, tarefa em que coincidem na altura Hermenêutica e Retórica – que a Hermenêutica alcança, com Mathias Flacius Illyricus, a sua primeira configuração importante. Impõe-se, numa época em que se dá a invenção da imprensa e a enorme difusão da leitura e da escrita, como modelo de uma leitura implicada, isto é, feita por motivos de autocomprensão.Integra-se no contexto humanista mais amplo da redescoberta dos clássicos como modo de reagir contra o estilo de ensino da escolástica e seu apoio nas autoridades eclesiásticas. Pressupõe um conceito de verdade que nada tem de metódico ou desinteressado, pois parte de uma pré-compreensão e está por sua vez relacionado com o efeito praxístico da palavra e com o problema existencial da orientação no mundo.A ideia de fundo de toda esta Hermenêutica protestante que se desenvole em clima humanista e que vai desaparecer com o Romantismo é a seguinte: o homem é um ser capaz de ser tocado e modificado pelo poder e efeito de palavra. Logo, os textos contêm a verdade sobre as coisas : uma verdade que não implica certeza nem verificação pois é, antes de mais nada, linguagem, abertura, isto é, uma proposta fundamental de sentido que só chega realmente a acontecer se é apropriada por alguém que na sua leitura ou interpretação saiba fazer sentido.

A partir do séc. XIX, com F.Schleiermacher (1769-1834), a Hermenêutica adquire toda uma nova dimensão, filosófica e epistemológica que a desliga,enquanto teoria universal da compreensão e interpretação, de todos os momentos praxísticos e dogmáticos da hermenêutica anterior.Preocupado em defender com a sua teoria hermenêutica o carácter científico da teologia e formado filosoficamente no modelo moderno do conhecimento transcendental, Schleiermacher, romântico, coloca o centro de gravidade de uma Hermenêutica na análise da operação gnosiológica comum a toda a interpretação.É o contéudo cognitivo do discurso e não o seu efeito retórico ou uma análise dos signos, o único objecto da interpretação, que onde quer que se exerça – âmbito bíblico, jurídico ou filológico – procura sempre vencer um mal-entendido, aquele que é provocado pela compreensão da linguagem, enquanto esta é a expressão de um pensamento individual.Conciliada com a lógica e metodologia da ciência e seu problema fundamental – o do conhecimento – a hermenêutica torna-se agora universal, unificando as várias práticas interpretativas existentes, até então, por meio de uma reflexão sobre o acto cognitivo específico da interpretação da palavra ou compreensão.É a apropriação romântica do modelo moderno da subjectividade transcendental que permite a Schleiermacher afastar a Hermenêutica do seu local originário – a faculdade comunicativa que permite a convivência dos seres humanos e dá a conhecer a tradição que os sustenta – e descobrir a operação comum a toda a actividade de interpretação.Identifica-a como a comprensão da alteridade que se exprime linguisticamente e que, por essa mesma razão,provoca a tensão entre pensamento individual e linguagem comum, gerando a incompreensão e o mal- entendido ( agora universais).À Hermenêutica, como arte de evitar o mal-entendido, interessa fundamentalmente meditar a estranha relação que existe entre falar e pensar.A sua principal tarefa reside numa reflexão sobre as condições que permitem ultrapassar o mal-entendido em ordem a poder compreender o outro, que se exprime no texto, melhor do que ele se compreendeu a si mesmo. Com sua célebre introdução de uma interpretação psicológica necessária para completar a interpretação gramatical tradicional , Schleiermacher desloca o verbo interior do texto para o âmbito meramente psicológico do seu criador consagrando a ideia de que compreender um texto é reconstruir a intenção mental do seu autor.

Esta interpretação psicológica, apoiada na teoria romântica da criação inconsciente do génio, passou a ser depois de Schleiermacher a base teórica cada vez mais relevante das ciências do espírito.Com Dilthey (1833-1911) – o autor do pacto entre Hermenêutica e ciências do espírito – são os problemas lógico-gnosiológicos, relativos à fundamentação do conhecimento histórico o núcleo de uma Hermenêutica, que tem como principal tarefa o conhecimento e descrição das leis da vida espiritual, que constituem o fundamento comum das diferentes ciências humanas.Profundamente preocupado com a complexa questão da objectividade do historicamente condicionado, Dilthey, representante da consciência histórica e das filosofias da vida, recusa a lógica explicativa das ciências da natureza como via de acesso ao mundo histórico. Não quer, no entanto, cair no relativismo históri-co. Parte assim da relação essencial entre vida humana , expressão e sua significação,afir-mando a dimensão compreensiva ou hermenêutica desta relação. Comprende-se o homem, explica-se a natureza – tal é a célebre oposição que marca o desenvolvimento da sua Hermenêutica.O mundo histórico escapa pela sua estrutura semântica à categoria do dado. Nele a ideia de sinal e sentido (nexo estruturado) como que faz parte da própria natureza da coisa. É o mundo vivido, algo que se revela indirectamente,isto é,apenas por meio dos seus sinais (textos, obras) ou exteriorizações, que desde logo nos remetem para um todo global de sentido. Este ultrapassa qualquer associacionismo explicativo.Daí a necessidade de uma Hermenêutica que procurando chegar ao conjunto da vida psíquica se transforme no modelo metodológico apropriado para as ciências humanas.

A Hermenêutica trasforma-se assim na teoria universal da compreensão e interpretação das objectivações significativas da vida histórica.O seu núcleo fundamental reside agora na possibilidade que tem a consciência histórica de reconstruir, a partir das significações da vida fixadas de modo duradouro, a intenção e as circunstâncias originárias do autor. Interpretar é, na linha de Schleiermacher, reconstruir uma construção cuja chave deve ser procurada na intenção do autor.

Será com M. Heidegger que virá a ser ultrapassada esta orientação epistemológica da Hermenêutica diltheyana da vida .Interessado, como Dilthey, na temática da história e da historicidade da vida, Heidegger escreve uma obra, Ser e Tempo(1927), onde a compreensão hermenêutica aparece ligada à exigência urgente de uma reposição da questão do sentido do ser.É que Heidegger sabe que a questão da historicidade é hermenêutica porque abriga em si uma outra questão de fundo: o mistério da temporalidade. E este não é um problema gnosiológico qualquer mas algo que diz essencialmente respeito ao modo de ser desse ser-aí que é o humano.Esta é uma questão fundamental esquecida pela tradição e que implica antes de mais toda uma nova ideia de fundamentação.

Com Heidegger, a Hermenêutica alcança todo um novo sentido.Deixa definitivamente o registo psico-epistemológico e converte-se na questão ontológica central do filosofar .A novidade de Heidegger reside justamente nesta descoberta do problema metafísico- hermenêutico implicado na questão da historicidade, sempre esquecida por toda a tradição e que não pode determinar-se mais por privação a partir de uma ideia de ser absoluto ou eterno. Exige para ser tratada uma “hermenêutica da facticidade” do existir, isto é, uma analítica da própria essência finita do existir humano.O fio condutor desta nova concepção de hermenêutica, para a qual a compreensão é, antes de mais ,o modo próprio de ser do humano, é o seguinte: a problemática da finitude ou historicidade do existir, levada a sério, obriga a pensar o humano como a ambiguidade fundamental da experiência do limite(mortalidade) e simultâneamente de uma exigência de incondicionado ou abertura, que se expressa na própria interrogação que todo o homem faz sobre o sentido do ser. Isto significa que a experiência da temporalidade radical é a experiência do ser ou do sentido, uma experiência hermenêutica de contraste, que resiste ao tradicional modelo da objectividade (a que Dilthey ficara ainda ligado).A analítica da existencialidade da existência deve assim revelar a textura ontológico- hermenêutica do modo de ser finito do existir descobrindo, desde logo, a sua fundamental pertença a uma situação no mundo.O”Dasein”,porque é temporal, é hermeneia originária. Não se concebe mais como um sujeito transcendental e desenraízado.Toma consciência de si como sentimento da situação , que implica toda uma pré-compreensão a partir da qual surge a compreensão, não como comportamento teórico- desinteressado, mas como a revelação de um saber e poder ser já sempre exercidos e do que há ainda por exercer. À compreensão enquanto “ projecto lançado” pertence assim a possibilidade de se explicitar, interpretando ou configurando tal ou tal núcleo de possibilidades . Surge assim a interpretação como uma explicitação ou apropriação da compreensão que só é possível sobre o pano de fundo do futuro e da totalidade pré-compreendida. A interpretação explicita agora o que já foi previamente entendido desenhando-se assim o círculo da compreensão e da interpretação, que corresponde à natureza temporal e antecipadora do existir(cf. círculo hermenêu-tico).Ela é a primeira forma de articulação do estar-no mundo.Parte sempre de pressupostos (de todo o previamente visto e compreendido pelo sentimento da situação)e nunca de um qualquer grau zero.Corresponde a uma forma pré-predicativa de dizibilidade – o horizonte do sentido – relativamente à qual a lógica predicativa clássica aparece como derivada e empobrecedora.Para Heidegger,só depois do desvelamento das coisas o homem finito pode falar sobre elas e o círculo da compreensão e da interpretação assinala o lugar originário do desvelamento e a sua dizibilidade originariamente pré- predicativa.Daí a distinção que o autor estabelece em Ser e Tempo entre enunciado e discurso. Tal distinção visa revelar como a compreensibilidade que sempre se exprime no discurso (um existencial tão originário como o sentimento da situação, a compreensão e a interpretação) ultrapassa a redução clássica do dizer ao enunciar. O âmbito hermenêutico do dizer , do enunciar e do comunicar tem agora raízes ontológicas profundas, que desmontam a redução psicológica da hermenêutica moderna e abrem à Hermenêutica todo um novo e importante horizonte.

É neste novo contexto marcado pelo primado da questão ontológica da temporalidade do existir que se situa H.-G.Gadamer com a sua conhecida obra Verdade e Método.Elementos de uma Hermenêutica Filosófica.Assumindo como decisiva a herança de Heidegger, com quem diz ter aprendido o essencial, o filósofo de Heidelberg retoma a problemática hermenêutica das ciências do espírito, interrogando-se sobre as consequências que decorrem para esta temática do facto de Heidegger ter derivado a estrutura de antecipação da compreensão da temporalidade do existir. O objectivo é mostrar que à Hermenêutica não interessam tanto os métodos ou os princípios interpretativos que intervêm no mundo do espírito mas fundamentalmente esclarecer o fenómeno ontológico da compreensão que caracteriza, desde Ser e Tempo, o modo de ser do existir. De acordo com Gadamer, a Hermenêutica de Dilthey pressupunha já algo que este autor não soube tratar e que hoje, depois de Heidegger, se revela como o verdadeiro núcleo suscitador de toda a compreensão. É o facto de a existência humana não se limitar a um puro estar dado mas ser em si mesma temporalidade, distância de si a si , perguntabilidade, linguagem, que suscita no mundo o problema da compreensão. Ser compreensão e não puro bios instintivo ,tal é a essência do único ser que é historicidade, abertura, isto é, um ser para o qual ser é compreender. A compreensão, modo de ser do humano, manifesta-se então, de forma originária, como um acontecer de sentido no qual todo o existir de rosto humano se encontra já sempre mergullhado,mesmo sem disso ter consciência, para o qual contribui com a sua apropriação ou interpretação particular e cujas raízes remontam ao próprio fenómeno da tradição (transmissão).À hermenêutica cabe então, e antes de mais , examinar as condições em que acontece o fenómeno da compreensão.Na análise destas condições Verdade e Método recusa frontalmente o moderno primado do método, que considera derivado, desenvolvendo, pelo contrário, a estrutura antecipativa de todo o compreender como o núcleo de uma pertença a costumes , a pressupostos, e a usos linguísticos, que não podem ser esquecidos, pois determinam sempre a atitude interpretativa característica do modo de ser do humano.A compreensão, afirma o autor, não pode pensar-se como uma acção da subjectividade mas como um processo no seio do próprio acontecer da tradição. Toda a interpretação, se desenvolve no âmbito do acontecer da linguagem ou trasmissão, parte de pressupostos, que marcam o enraizamento do sujeito num mundo já sempre dito ou significado. Logo, “só o reconhecimento do carácter essencialmente pré-conceitual de toda a compreensão confere ao problema hermenêutico a sua real agudeza”(V.M,162). O modelo da hermenêutica é agora o do diálogo implicado, suscitado pelo modo como as questões do texto põem em jogo os pressupostos e motivações de cada intérprete ( cf. quanto a este assunto a rubrica preconceito). A tradição , identificada pelo autor como o conjunto de preconceitos trans-subjectivos que orientam a interpretação, funciona aqui de um modo decisivo mas não dogmático como o horizonte contextual que permite a suscitação de novas questões e dos problemas em aberto re(a)presentados pelo texto. Constitui-se como um acontecer ou processo histórico a partir do modelo dialógico da fusão ou entrelaçamento de horizontes. Compreender é agora refigurar de um modo questionante e constante o processo de transmissão espiritual que constitui a humanidade do humano (baseada em textos, símbolos, obras de arte) de acordo com uma lógica dialéctica a que o autor chama apropriação ou aplicação . Interpretar não é agora reconstruir ou coincidir, chegar apenas à dimensão cognitiva do dito, como pensava a hermenêutica romântica, mas compreender-se à luz do texto , isto é, traduzir para o horizonte do presente o sentido das suas questões e responder-lhes com os conceitos do presente . Só interpretamos um texto ou obra de arte se ele ainda nos diz algo hoje, isto é, se ajuda a configuração do nosso próprio presente . De outro modo nem sequer o interpretamos. Na raíz da compreensão hermenêutica está uma exigência ético-praxística de autocompreensão suscitada pelo facto de se ser um ser finito, de se existir a partir de tradições e, ainda, pelo facto de o ser humano ser uma perguntabilidade fundamental. Tal é a grande novidade da hermenêutica de H.-G. Gadamer, cujos temas centrais são os conceitos de efeito histórico, preconceito, fusão de horizontes, diálogo e jogo.

Com P. Ricoeur, a Hermenêutica entra numa nova fase, mais crítica, dada a importância que este autor atribui ao fenómeno da linguagem e ao seu tratamento específico pelas chamadas ciências da linguagem. Herdeiro da mudança introduzida por Heidegger e Gadamer, Ricoeur propõe à hermenêutica tradicional – que considera partir de uma atitude de confiança, ainda não fundada – uma via longa, isto é, todo o chamado desvio pelos signos em que se manifesta o acto característico de existir ou compreensão. Temas fundamentais desta sua nova atitude são as noções de conflito (hermenêutico), explicação, símbolo, hermenêutica da confiança e hermenêutica da suspeita.

{bibliografia}

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